segunda-feira, 5 de maio de 2014

[ Discursivas CACD ] História do Brasil 2010: Relações Brasil-Argentina




























Guia de estudos CACD 2011

Prova 2010 - História do Brasil

Questão 1

"Analise as relações Brasil-Argentina nas três últimas décadas do século XIX."

Daniel Ferreira Magrini 


"O fim da Guerra do Paraguai marca nova fase nas relações entre Brasil e Argentina.

Destruída a ameaça paraguaia à ordem bipolar na bacia do Prata, os dois países retornaram tensões e rivalidades que antecederam a Tríplice Aliança. Nesse sentido, tanto Brasil quanto Argentina buscaram a articulação com os vizinhos sul-americanos para conter o rival, o que provocou alterações em certos aspectos da política externa de ambos. 

Com a proclamação da República em 1889, o panorama de tensão não é profundamente alterado, apesar de algumas mudanças evidenciadas na Questão de Palmas (missiones). 

O prolongamento da permanência das tropas brasileiras no Paraguai durante o Gabinete Rio Branco (1871-1875) é sinal das transformações em direção à retomada da rivalidade. Este último marco de intervencionismo brasileiro na região platina durante o Segundo Reinado justificou-se, no âmbito das relações internacionais, pelo receio do avanço das pretensões argentinas na região do Chaco. 

Assim, esse acontecimento de caráter intervencionista indica a nova postura do Brasil de retraimento vigilante na política externa, preocupada principalmente com a contenção da influência argentina. 

Do lado argentino, postura brasileira é vista como direcionador de uma abordagem diferente: consolidada por Bartolomé Mitre, a Argentina não adotará posição expansionista tendo em vista a reconstrução do antigo Vice-Reino do Rio da Prata, como antes, mas buscará a aproximação com os demais Estados Hispânicos para conter o Brasil. 

Os dois primeiros cenários desses desdobramentos forma as negociações para definição de limites e as iniciativas panamericanistas. Até então, o Império do brasil insistira no uri possidetis e adotara postura firme de não ceder território nas negociações de limites com seus vizinhos; com o objetivo de evitar tensões que os aproximassem da Argentina unificada, o Brasil assume maior flexibilidade e diminui o ritmo, chegando até a cogitar a ante rejeitada idéia de arbitragem. 

Resultado disso foi a subsistência de diversas questões limítrofes até a República Velha. O Brasil também tira proveito das divergências de fronteira entre Argentina e Chile para se aproximar desse último. 

No âmbito do panamericanismo, a iniciativa pende para a Argentina, que busca aliança entre os países hispano-americanos com base na visão bolivarista. A diplomacia brasileira responde com esforços para evitar a formação de coalizão anti-brasileira. Desses dois palcos internacionais, pode-se depreender as articulações diplomáticas em torno da rivalidade das duas potências platinas. 

No âmbito econômico, a modernização dos dois países no contexto periférico do capitalismo industrial do século XIX coaduna-se com a realidade do eixo geopolítico. As duas economias guardam pouca complementaridade e, se exercem o mesmo papel de fornecedoras de matérias-primas agrícolas para os mercados centrais, seus principais produtos de exportação não são concorrentes: o Brasil é exportador de café principalmente para os Estados Unidos, enquanto a Argentina exporta carne e trigo para a Europa. 

No entanto, observa-se em certa medida, disputa entre os dois vizinhos pelos investimentos europeus na América do Sul, sobretudo nos setores de infra-estrutura de exportação. Se essa perspectiva indicaria o recrudescimento da rivalidade, cabe ressaltar também a demanda por empréstimos dos dois: o Brasil obteve, no final do Império, empréstimo vultoso de 20 milhões de libras esterlinas; tanto Brasil quanto Argentina saem da Guerra do Paraguai bastante endividados. 

No sentido contrário da relação causal das tensões Brasil-Argentina, a falta de cooperação entre os dois vizinhos afastou qualquer perspectiva e negociação conjunta no momento de crise dos dois, na década de 1890, porquanto o Brasil buscou maximizar isoladamente seus ganhos com o universalismo e a política de prestígio pautada nas viagens de D.Pedro II e a Argentina concentrou-se nos benefícios auferidos da relação íntima com o Reino Unido. 

A proclamação da República no Brasil provocou certos desdobramentos diferenciados na relação bilateral e na articulação em torno do retraimento vigilante brasileiro. 

A Argentina é o primeiro país a reconhecer o novo regime brasileiro e as divergências em relação à forma de Governo singular do Brasil no contexto americano são desfeitos. 

A presença do Brasil na Conferência Panamericana de Washington sinaliza mudança na política externa brasileira: da política pragmática firme do Império, passa-se ao americanizo ideológico flexível. O novo regime, instável no plano interno, procura melhorar as relações no eixo continental no plano externo. 

Se novamente a política panamericanista é indício da configuração das relações brasil-Argentina, as negociações de limites também não deixam de adquirir novos contornos. 

A indefinição das fronteiras na região de Missões, a oeste do estado de Santa Catarina, é razão para as negociações do chanceler Quintino Bocaiúva com a potência vizinha, o que culmina com a assinatura do Tratado de Montevidéu. 

Esse acordo, entretanto, não é ratificado pelo Congresso acional sob recomendação do próprio Bocaiúva; com efeito, cedia metade da região em litígio à Argentina, o que não satisfazia os interesses brasileiros. 

A recusa do Congresso brasileiro marca não somente o fortalecimento da instância parlamentar nos negócios estrangeiros, como também fornece subsídio para afirmar-se continuidade da rivalidade entre Brasil e Argentina. 

Outros eixos sinalizam mudanças além do pan-americanismo e fronteiriço, mas subsiste a tensão em torno do sistema bipolar platino. 

Durante a Revolta da Armada, o presidente Floriano Peixoto procura Buenos Aires para a aquisição de uma esquadra a fim de combater os revoltosos no Rio de Janeiro, o que é negado pela Argentina. Esse ocorrido evidencia que o grau de cooperação ensaiado após a queda da Monarquia não se traduziu em descontração do modelo de tensão nas relações entre brasil e Argentina: o vizinho platino não estava disposto a ceder parcela do poderio naval em prol da estabilização da República brasileira.

No eixo econômico, a simultaneidade entre o Encilhamento brasileiro e a crise da Bolsa argentina não gerou concertarão entre os dois, obrigando-os à aceitação de acordos draconianos com seus credores (funding lande Campos Sales). A falta de cooperação e seus prejuízos nas negociações com credores no final do século XIX não foi lição aprendida nas crises da dívida da década de 1980. 

A estabilização do regime republicano brasileiro com Campos Sales aponta novos rumos para as relações entre Brasil e Argentina, sem romper, contudo, com o paradigma da rivalidade. 

A resolução da Questão das Missões (Palmas) pelo arbitramento do presidente norte-americano Glover Cleveland em favor do Brasil desponta a figura do Barão de Rio Branco na diplomacia brasileira. Sob a perspectiva argentina, a conclusão desse litígio expõe a aproximação do Brasil com os Estados Unidos, que seria fortalecida por Rio Branco durante sua chancelaria e já fora prenunciada pelo Acordo Blaine-Mendonça de 1891 e pela contratação da "esquadra de papel" por Floriano para combater a Revolta da Armada. 

Nesse sentido, a Questão de Palmas é prévia do recrudescimento das tensões com a Argentina nas primeiras décadas do século XX.

A partir desses argumentos, pode-e verificar a caracterização das relações entre Brasil e Argentina nas últimas décadas do século XIX sob o eixo do retorno da rivalidade entre os dois vizinhos platinos. 

O fim da Guerra do Paraguai é marco da retomada das tensões bipolar do Cone Sul, em que se apresentam articulações no âmbito continental e aspectos econômicos. 

A proclamação da República provocou laços diretos entre os dois Estados; no entanto, a lógica regional geopolítica prevaleceu sobre obstáculos econômicos comuns e semelhanças internas. 

O paradigma da rivalidade é levado, após o intervalo da Tríplice Aliança, como fio condutor das relações entre os dois países até o período seguinte, no qual ganha nova dimensão." 

fonte: Guia de Estudos IRB para o CACD 2011

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