sexta-feira, 23 de maio de 2014

Conexão Brasil-África

As relações crescentes entre Brasil e África
AKLILU SHIKETA

O ex-presidente do Brasil Luiz Inácio Lula da Silva disse certa vez que "o Brasil tem uma responsabilidade moral e ética para com o continente africano".

Ele também teve a generosidade de reconhecer que o Brasil foi construído em cima do "trabalho, do suor e sangue de africanos" levados para o outro lado do Atlântico no comércio de escravos. Da população brasileira atual, 51% não é branca. Cinco países africanos falam a mesma língua que o Brasil.

O Brasil e os países africanos de língua portuguesa (Guiné-Bissau, Cabo Verde, São Tome e Príncipe, Moçambique e Angola) fazem parte da mesma instituição, a Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP).

O Brasil foi responsável pela criação da Cúpula América do Sul-África (ASA), que teve sua primeira reunião na Nigéria, em 2006, a segunda na Venezuela, em 2009, e a terceira em 2011 na Guiné-Bissau. A Cúpula tem por objetivo fomentar a cooperação "na governança, no desenvolvimento rural, comércio, investimentos e infra-estrutura".

Hoje o Brasil tem mais missões diplomáticas na África do que tem o Reino Unido. Apenas entre 2003 e 2010, o Brasil abriu 17 novas embaixadas na África e visitou 23 países africanos. A presidente atual, Dilma Rousseff, visitou três países africanos em seu primeiro ano no poder (Angola, Moçambique e África do Sul).

A visita da presidente foi seguida pouco depois pela de seu ministro do Comércio, Fernando Pimentel. A presidente também criou o Grupo de Trabalho da África para dar continuidade a questões relacionadas à cooperação Brasil-África.

No lado africano, o presidente da Tanzânia esteve no Brasil em abril de 2012. Em março de 2012, o presidente de Cabo Verde também visitou o país. Muitos líderes africanos, incluindo o primeiro-ministro da Etiópia, participaram na conferência da ONU Rio + 20, em junho de 2012 no Rio de Janeiro.

Vistas em perspectiva, as relações entre África e Brasil estão se aprofundando e alargando ao mesmo tempo.

O BRASIL EM UM TERRITÓRIO NOVO

Em abril de 2012 o então ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota, esteve na Etiópia, onde se reuniu com o primeiro-ministro da Etiópia e discutiu as áreas de cooperação bilateral. 

Patriota também se reuniu com o vice-primeiro-ministro e o ministro do Exterior da Etiópia e assinou uma série de acordos bilaterais que vão reforçar a posição do Brasil e assegurar sua parceria com a Etiópia.

De acordo com o Itamaraty, a visita de Patriota reflete o fortalecimento dos laços bilaterais desde a abertura da embaixada brasileira em Adis Abeba, em 2005.

Meles Zenawi, o primeiro-ministro da Etiópia, saudou o engajamento intensificado do Brasil com a África e deseja que isso aumente. Ele pediu especificamente que Brasil e Etiópia cooperam nas áreas de energia renovável, desenvolvimento de infraestrutura e pesquisas agrícolas.

Delineando o interesse do Brasil, o chanceler Patriota falou do comércio e o investimento, de um lado, e dos assuntos regionais e globais do outro.

A visita do ministro Patriota à Etiópia foi um marco no contexto mais amplo das relações Brasil-África, na medida em que Adis Abeba é a sede diplomática da África e a Etiópia é a economia em crescimento mais acelerado no continente.

De acordo com a The Economist Intelligence Unit, nos próximos quatro anos a Etiópia está prevista para ser a terceira economia do mundo em termos de velocidade de crescimento.

Essa foi uma das razões pelas quais os organizadores do Fórum Econômico Mundial (FEM) escolheram a Etiópia para sediar a Cúpula Empresarial do FEM 2012. A cúpula, que reuniu milhares de líderes empresariais de todo o mundo, em Adis Abeba ente 9 e 12 de maio de 2012.

O Brasil, cujo comércio com a África passou do marco de US$ 20 bilhões em 2010, agora tem empresas que estão começando a fazer negócios na Etiópia. A gigante da mineração Vale e a construtora gigante Andrade Gutierrez são exemplos disso.

Mas, em comparação com o número e a escala de envolvimento de empresas de outras economias emergentes como China e Índia, o envolvimento de empresas brasileiras na Etiópia, que é a economia em mais rápido crescimento na África, ainda não chega a ser significativo.

O fato de que o Brasil pretende intensificar suas relações com a Etiópia sugere que sua relação com a África agora não focaliza apenas o pequeno grupo de países produtores de petróleo, por um lado, e os países lusófonos, por outro.

É mais fácil acessar o continente africano a partir de Adis Abeba. Enquanto quase todos os países da África possuem uma embaixada em Adis Abeba, a Ethiopian Airlines tem vôos para 40 destinos no continente. E a Etiópia faz fronteira com seis países africanos.

UMA VIA DE DUAS MÃOS

Tanto o Brasil quando a África têm interesse em ver acontecer reformas nas instituições financeiras internacionais e no Conselho de Segurança das Nações Unidas. Existe de ambas as partes uma crença forte em que as instituições em questão não refletem a realidade atual.

Assim, como sede da União Africana, e pelo fato de seu primeiro-ministro ser o porta-voz africano na Conferência sobre Mudanças Climáticas, no G20 e no Fórum Econômico Mundial, a Etiópia está perfeitamente posicionada para trabalhar com o Brasil para promover os interesses da África e do Brasil.

Portanto, podemos concluir que o chanceler Patriota teve toda razão quando disse a seu colega etíope, Hailmariam Desalegn, que o Brasil quer cooperar com a Etiópia em assuntos regionais e globais.

Não é apenas o Brasil indo à África, é também a África que está vindo ao Brasil.
Nos últimos dez anos, vários países africanos abriram embaixadas em Brasília. A Etiópia foi um deles. Quando o Brasil abriu sua embaixada em Adis Abeba, em 2005, a Etiópia respondeu abrindo sua embaixada em Brasília, em 2011.

O fato de a decisão da Etiópia de reabrir sua embaixada no Brasil ter sido seguida pelo fechamento de suas embaixadas na Suécia e no Canadá transmitiu uma mensagem contundente de que a Etiópia está determinada a reforçar suas relações com o Brasil.

Em sua capacidade de coordenador do Grupo África, o papel da Etiópia durante a campanha de eleição da Diretoria Geral da FAO, em 2010, de unir a África em torno do candidato brasileiro José Graziano da Silva, foi outra demonstração de sua determinação em fortalecer sua relação com o Brasil.

A Etiópia acredita que pode encontrar no Brasil parceiros para o desenvolvimento. Como o governo brasileiro, o governo etíope é progressista e busca o desenvolvimento.

No cerne de suas políticas estão a redução da pobreza, os investimentos em saúde e educação, incentivar o setor privado a liderar a economia, a ampliação de infraestrutura como ferrovias e usinas elétricas, a transformação do setor agrícola e o apoio à exportação.

Essas medidas renderam bons frutos, resultando em um crescimento de 11,4% no PIB em 2011/2012. A entrada de investimentos estrangeiros diretos de países como China, Índia, Turquia, Arábia Saudita, França, Reino Unido, Canadá, EUA, Israel, Holanda, Alemanha, Itália, Sudão e Iêmen é atribuída a essas medidas.

Os setores de investimento em que estão engajadas as companhias dos países acima citados incluem o agronegócio, a manufatura, a construção de ferrovias e usinas elétricas e a exploração de petróleo e gás. Todos os setores acima citados são áreas em que as empresas brasileiras são boas.

Empresas brasileiras também podem envolver-se no fornecimento de maquinário ou componentes para dez fábricas de açúcar que o governo etíope pretende construir nos próximos quatro anos. Como dizem que os investimentos têm a ver com mercado e localização, as empresas brasileiras que exportam para o Oriente Médio também podem aproveitar a oportunidade de fazer negócios na Etiópia, na medida em que o país se situa ao lado do mar Vermelho.


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