sexta-feira, 17 de julho de 2015

Bolívia e o Mercosul

A 48o edição do encontro da cúpula dos chefes de Estado do Mercosul, ocorre nos dias 16 e 17 de julho em Brasília.  

A cúpula se reúne a cada seis meses e a última ocorreu em dezembro de 2014 na cidade argentina de Paraná. 

Entre vários temas relevantes - como a discussão sobre as crises econômicas, o fraco desempenho dos países participantes do bloco e as dificuldades enfrentadas na consolidação da integração regional - será assinado hoje (17) o documento para adesão da Bolívia como membro pleno do Mercosul.

A Bolívia é um país associado ao bloco desde 1996, podendo participar das reuniões que tratam dos interesses comuns dos países membros.    

A adesão definitiva da Bolívia já havia sido discutida em reuniões anteriores, mas não havia sido definida data para sua admissão. 

Com a incorporação, o bloco passa a ter 6 países fixos: Brasil, Argentina, Paraguai, Uruguai, Venezuela e agora Bolívia. 

Para que um país seja aceito como membro permanente do Mercosul é necessária a aprovação dos representantes diplomáticos de todos os países membros plenos, bem como a aprovação legislativa interna de cada país. 

Na última reunião, no ano passado, quase todos os participantes haviam aceitado a inclusão da Bolívia, menos o Paraguai. 

O Paraguai estava suspenso do Mercosul, devido a remoção de Fernando Lugo da presidência do país em 2012, fato que gerou crise diplomática entre os países sul-americanos.  

Outros Membros

Na mesma cerimônia de assinatura de entrada da Bolívia como membro permanente, será também assinado documento formalizando a entrada de Guiana e Suriname como membros associados. 

Guiana e Suriname juntam-se assim ao Chile, Colômbia, Equador e Peru como membros associados.   

Além destes países associados, o México e a Nova Zelândia fazem parte do grupo, porém como países observadores.   

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terça-feira, 14 de julho de 2015

A Teoria dos Dois Campos e a Coexistência Pacífica

Stalin e Andrei Zdanov - A Teoria dos 2 Campos

Em 1947 Andrei Zdanov, ideólogo do stalinismo, concebeu a fórmula conhecida como a Teoria dos Dois Campos que serviu como cobertura ideológica para que o Partido Comunista da URSS acelerasse a satelitização do Leste europeu. 

Era a resposta soviética ao Plano Marshall de Churchill e à Doutrina Truman que, juntos, lançaram as bases da política anglo-americana da "contenção" ao comunismo que deu início à Guerra Fria.

Zdanov e a Teoria dos Dois Campos

A "Teoria dos dois Campos"  de Andrei Zdanov foi a resposta soviética à política norte-americana pós-guerra de distanciamento e hostilidade aos comunistas, especialmente após o discurso de Winston Churchill em Fulton, Missouri, Estados Unidos - onde surgiu a famosa expressão "Cortina de Ferro".

O clima de tensão entre os dois blocos hegemônicos no pós-guerra foi intensificado pela iniciativa do Plano Marshall - capitaneado pelos EUA - para reconstrução da economia mundial mas que deixava de fora os países do bloco socialista. 

Adicionava-se ainda à conjuntura de confrontamento, as ideias da chamada "Doutrina Truman", que claramente esboçavam uma política de isolamento em relação à crescente influência soviética na Europa e no extremo oriente.

A "Teoria dos dois campos"  foi utilizada como pretexto para que o Partido Comunista Soviético dinamizasse sua influência ante os países do Leste Europeu, tornando-os assim "satélites" soviéticos. 


A Teoria dos Dois Campos foi lançada em Szklarska Poreba, na Polônia, por ocasião da constituição do Kominform (Birô de Informação Comunista), a 22 de setembro de 1947, sendo uma réplica frontal ao Plano Marshall de auxílio à Europa.

De acordo com o que se pronunciou naquela reunião, todas as esferas da ação e pensamento estavam divididas em dois campos mutuamente excludentes, antagônicos e irreconciliáveis, sendo representados mundialmente pelas duas grandes potências, EUA e URSS. 

No primeiro bloco, estavam respectivamente os EUA sob liderança do Bloco Imperialista e Democrático, enquanto que a União Soviética fazia parte do grupo Antiimperialista e AntiDemocrático. 

Do mesmo modo, nos campos da filosofia e da ciência, o ser humano estaria diante de dois caminhos, o do idealismo socialista ou o do materialismo capitalista, sendo estudiosos, pesquisadores e grandes mentes das artes e das ciências em todos os tempos analisados e vistos a partir de tal paradigma; no cenário político, estaria-se experimentando a luta entre imperialismo e socialismo. 

Em resumo, todos os aspectos da existência humana estariam submetidos a tal dualidade, uma disputa entre o bem e o mal, em que o cidadão soviético que não estivesse alinhado entusiasmadamente com os ideais socialistas, estaria logicamente do outro lado, ou seja, o do mal.

A Teoria dos dois campos servia assim a dois propósitos: manter toda a população soviética unida em torno da doutrina stalinista, abafando de modo eficaz qualquer tipo de revolta contra o governo, e por outro lado, servia também para demonizar o outro lado, o dos norte-americanos, tornando-os inimigos a serem batidos pelo bem da sociedade proletária, facilitando a união dos comunistas espalhados pelo mundo em torno da URSS .

Apesar da Teoria dos dois campos estar presente de modo implícito na cultura popular produzida no ocidente durante muito tempo, ela entra em decadência já na metade da década de 1950, com morte de Stalin e a ascensão de Nikita Khrushchev como secretário-geral do partido comunista soviético. 

Khrushchev denuncia Stalin e o seu chamado "culto da personalidade", iniciando uma outra forma de convivência com os países ocidentais, batizada de "Coexistência Pacífica".

Khrushchev e a Coexistência Pacífica

Com a morte de Stalin em 5 de março de 1953, abriu-se uma nova fase nas relações internacionais. Nikita Khrushchev assume o poder no Kremlin e lança uma nova política externa, com objetivo de distender as tensões entre os EUA e a URSS. Esta nova teoria foi denominada de Coexistência Pacífica

A Coexistência Pacífica defendia a ideia que era possível um relacionamento pacífico com o capitalismo.

Khrushchev iniciou processo interno de abertura, amenizando a censura, reduzindo o poder da polícia política, reabilitando presos políticos do regime de Stalin e fechando campos de trabalhos forçados. Esse processo foi denominado de "Degelo" e "Desestalinização" 

Estas ações soviéticas repercutiram amplamente nos países socialistas da Europa Oriental. Em 1956 ocorre a Revolução Húngara que teve por objetivo por fim ao aparato repressivo do regime stalinista. A revolução no entanto foi sufocada por intervenção da própria URSS. 

O impacto da doutrina da Coexistência Pacífica também teve impactos na China. A China sob liderança de Mao Tse-tung, se distancia da URSS alegando que a atitude de confronto conta o capitalismo deveria ser mantida, rejeitando as ideias da coexistência pacífica.

No entanto, a partir de 1972 a China decide estabelecer relações comerciais com os EUA e  a acaba adotando uma "versão própria" da Coexistência Pacífica.

A Coexistência também possibilitou uma aproximação dos líderes da URSS e dos EUA. Khruschev reuniu-se diversas vezes com os presidentes Eisenhower e John Kennedy, entre 1956 e 1961. 

A distensão entre as superpotências no entanto não impediram que elas reafirmassem suas hegemonias em suas respectivas áreas de influência. 

Em 1953 as tropas de ocupação soviéticas reprimem violentamente protestos na Alemanha Oriental. Como comentado acima, em 1956 a URSS reprime brutalmente a revolução na Hungria. 

Os EUA também intervém com força para a derrubada de governos progressistas como o de Mossadegh no Irã em 1953, e em 1954 contra Arbenz na Guatemala. 

Esta ações mostram claramente a complexidade desta nova fase nas relações internacionais, que teve na crise dos mísseis soviéticos em Cuba em 1962 provavelmente o momento mais tenso da história mundial recente.      

Bibliografia:


1 Voltaire SCHILLING - Zdanov e a Teoria dos Dois Campos  

2 Eric Hobsbawn - A Era dos Extremos

segunda-feira, 6 de julho de 2015

Direito Internacional dos Direitos Humanos























Direito Internacional dos Direitos Humanos é um ramo do Direito Internacional que veio a ganhar um maior peso na Ordem Jurídica Mundial, principalmente na Segunda metade do século XX com o aumento da importância da pessoa humana enquanto aceita como sujeito do Direito Internacional ao lado dos Estados e Organizações Internacionais. 
Histórico 
Na antiguidade, não se encontravam verdadeiras declarações dos direitos dos cidadãos, frente à suprema e ilimitada autoridade do Estado. Só na Idade Média, com a difusão da organização feudal, quando se forma, lentamente, a convicção de estar obrigado em relação a autoridade superior somente àquelas prestações particulares (tributos, obrigações militares, etc.), voluntariamente aceitas no pacto de vassalagem. 
Tratava-se, sempre, de direitos e de deveres públicos que vinculavam reciprocamente apenas o soberano e seus feudatários, enquanto que a massa submissa dos súditos ficava privada de toda defesa jurídica eficaz contra os próprios governantes.
Entretanto, no passado houve manifestações importantes para o desenvolvimento e estudo dos direitos do homem, como por exemplo a Magna Carta de 1215, considerada a base das liberdades inglesas, onde os senhores feudais, descontentes com os abusos na taxação de impostos e pelas sucessivas derrotas da Inglaterra frente à França, impuseram ao rei João Sem-Terra esse documento, que determinava que a partir de então os reis ingleses só poderiam aumentar impostos ou alterar leis com a aprovação do Grande Conselho, composto por membros do clero, condes e barões; ou ainda as posições tomadas pela Escola Espanhola em defesa das populações indígenas nas terras recentemente descobertas.
Dentre os documentos anteriores à Segunda Guerra Mundial, três se destacam: A Declaração Inglesa de 1689 (Bill of Rights), que além de estabelecer as bases da monarquia parlamentar, determinou a garantia da liberdade de imprensa e da liberdade individual, a proteção à propriedade privada e a autonomia de atuação do poder judiciário; a Declaração norte-americana de Independência, elaborada por Thomas Jefferson; e a Declaração francesa sobres os direitos do homem e do cidadão de 1789, que foi resultado direto dos movimentos filosófico-jurídicos determinados pelo jusnaturalismo europeu, e cuja influência nos movimentos de independência dos países da América Latina não pode ser ignorada. 
Os princípios consagrados pelas três citadas declarações tiveram acolhidas nas principais constituições liberais. A proteção dos direitos era, contudo, de natureza interna.
A Segunda Guerra Mundial com a série de atrocidades cometidas, veio demonstrar que os direitos do homem necessitavam ser protegidos pelo Direito Internacional. 
Na estruturação da Ordem Internacional, a instituição da Organização das Nações Unidas através da Carta de São Francisco, assinada em 26 de junho de 1945, veio a conferir aos direitos humanos uma estatura constitucional no ordenamento do direito das gentes, já que até a sua fundação não era seguro afirmar que houvesse, em Direito Internacional Público, preocupação consciente e organizada sobre o tema dos direitos humanos. 
A adoção da Carta garantiu os pressupostos jurídicos que permitiram à sua Assembléia Geral, reunida em Paris, adotar a Declaração Universal dos Direitos do Homem, em dezembro de 1948, que vem a ser o marco mais importante no estudo dos direitos humanos. 

Declaração Universal dos Direitos do Homem

A Declaração tem um texto que exprime de modo amplo as normas substantivas relacionadas ao tema, e no qual as convenções posteriores encontrariam seu princípio e sua inspiração; seus dispositivos não constituem exatamente uma obrigação jurídica para cada um dos Estados, já que o respectivo texto foi adotado sobre forma de resolução da Assembléia.
Os direitos enumerados na Declaração são de duas espécies: 

1. Direitos de Primeira Geração - direitos civis e políticos
2. Direitos de Secunda Geração - direitos econômicos, sociais e cultuarias. 

Os direitos civis e políticos, que são chamados de direitos de primeira geração, são a reafirmação da liberdade em oposição à ação do Estado, que tem a obrigação de se abster de atos que possam representar a violação de tais direitos. 
Já os direitos econômicos, sociais e culturais, correspondem aos chamados direitos de segunda geração. A estes direitos vieram a somar-se outros tidos como direitos de terceira geração, que correspondem aos direitos do homem a um ambiente sadio, o direito à paz, o direito ao desenvolvimento e o direito aos bens que constituem o patrimônio comum da humanidade.
Embora os princípios acolhidos na Declaração Universal dos Direitos do Homem, passassem a ter o status de direito internacional costumeiro, a adoção de tratados sobre os direitos humanos foi considerada necessária pela Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas, e desta forma prepararam-se, em 1966, os Pactos das Nações Unidas sobre direitos civis e políticos, econômicos e sociais -- amplo desdobramento, já agora com força jurídica convencional, do que se proclamara dezoito anos antes.

Sistema Universal e Sistemas Regionais

O primeiro ponto a ser ressaltado sobre os Sistemas Internacionais de proteção aos direitos humanos é o de que a Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948, não institui qualquer órgão internacional de índole judiciária ou semelhante para garantir a eficácia de seus princípios, nem abre ao ser humano, enquanto objeto de proteção, vias concretas de ação contra o procedimento estatal que venha a ofender seus direitos. 
Segundo Francisco REZEK, "somente em dois contextos regionais, o europeu ocidental e o pan-americano, chegaram-se a instituir sistemas de garantia da eficácia das normas substantivas adotadas, no próprio plano regional, sobre os direitos da pessoa humana. 
A Corte Européia dos Direitos do Homem, sediada em Estrasburgo, cuida de aplicar a Convenção de 1950. A Corte Interamericana de Direitos Humanos, sediada em São José da Costa Rica, garante vigência à Convenção de 1969. 
Nenhuma das duas é diretamente acessível aos indivíduos." 
O Sistema Universal de promoção e proteção dos direitos humanos coexiste com os três mais importantes sistemas regionais:

A - Sistema Europeu
B - Sistema Africano 
C - Sistema Interamericano  

O Sistema Europeu funciona dentro da estrutura da Comunidade Européia e tem por fundamento a Convenção Européia para a Proteção dos Direitos Humanos e das Liberdades Fundamentais, adotada em Roma em 1950. 
O Sistema Africano funciona dentro da estrutura da Organização da Unidade Africana e é baseado na Carta Africana do Direito do Homem e dos Povos de 1981. 
Já em relação ao Sistema Interamericano, sete meses antes da aprovação da Declaração Universal dos Direitos Humanos, era assinada juntamente com a carta da OEA a Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem que inspirou-se nos trabalhos preparatórios que resultariam na Declaração Universal, . 
Em 22 de novembro de 1969, foi aprovada em São José da Costa Rica a Convenção Americana sobre a Proteção de Direitos Humanos, sua entrada em vigor ocorreu em julho de 1978; nela se discriminaram (nos âmbitos civil, político, econômico, social e cultural) direitos individuais situados entre a faixa elementar que concerne à vida, à integridade e à liberdade físicas, e aquela outra relativa à nacionalidade, à propriedade privada, e ao acesso às fontes da ciência e da cultura.
A Convenção da Costa Rica de 1969 reconhece a Comissão Interamericana de Direitos Humanos e a Corte Interamericana de Direitos Humanos, para tratar do cumprimento dos compromissos assumidos na Carta, pelos Estados pactuantes. 
Em linhas gerais a Comissão atua como instância preliminar à jurisdição da Corte. 
Ela tem competência para requisitar informações e formular recomendações aos governos dos Estados pactuantes. O trabalho pré-jurisdicional da Comissão pode ser instaurado contra um Estado-parte, por denúncia ou queixa formulada por entidade não-governamental, por qualquer pessoa ou grupo de pessoas e por outro Estado-parte. 
A Comissão pode publicar suas conclusões sobre o caso concreto, e alternativamente submeter a matéria à Corte Interamericana de Direitos Humanos. 
A Corte não é acessível a pessoas e instituições privadas, ela não relata, nem recomenda, nem propõe, mas profere sentenças, que o Pacto de São José da Costa Rica aponta como definitivas e inapeláveis.

Crimes contra a Humanidade

Dentre os atentados aos direitos humanos os mais graves são com certeza os que vão de encontro à integridade física da pessoa humana, caracterizados pela Ordem Jurídica Internacional como crimes contra a humanidade, que sempre receberam atenção especial por parte dos tratados internacionais.
Genocídio, escravidão, tráfico de pessoas, tortura e trabalhos forçados são exemplos desses crimes previstos pelo Direito Internacional. 
O primeiros desses crimes a ser combatido pela Sociedade Internacional foi o tráfico de escravos. A partir do século XVIII Estados europeus como Inglaterra e França deixam de dar proteção ao tráfico, no entanto, os primeiros esforços coletivos vieram no século XIX, com o Tratado de Paris (1814), o Congresso de Viena (1815) e a Conferência de Bruxelas (1885), por exemplo. 
Outros documentos que tratavam dessa mesma matéria foram adotados no século XX, culminando com a Declaração Universal dos Direitos do Homem (1948), que diz em seu artigo XXIII que todo homem tem direito ao trabalho livre e remunerado. 
Outros documentos posteriores tratam da repressão à escravidão e ao tráfico de pessoas, prova de que esse é um problema que ainda assola a comunidade internacional e que, por incrível que pareça, até pouco tempo ainda era encontrado institucionalizado em países como a Mauritânia, que aboliu a escravidão somente em 1980.
Outro crime tratado com grande relevância pelo Direito Internacional é o de genocídio. 
Embora sempre tenha existido na história da humanidade, somente na época da Segunda Guerra Mundial, com os abusos cometidos pela Alemanha e países do Eixo, teve início uma discussão séria sobre esse assunto. 
A palavra "genocídio" foi criada por Lemkim, em 1944, e denomina a conduta realizada contra grupos sociais, étnicos, religiosos ou nacionais, com a intenção de exterminá-los. 
Apesar dessa matéria ter sido objeto de julgamento no Tribunal de Nuremberg (mesmo não tendo sido apresentada com esse nome mas apenas enquadrada nos "crimes contra a humanidade"), foi somente na primeira Assembléia-Geral da ONU que surgiu a preocupação de reprimir o genocídio (tal denominação já estava amplamente difundida nessa época).
Dessa preocupação dos Estados, foi elaborada e aprovada em 1948, a Convenção para a Repressão e Prevenção do Crime de Genocídio
Essa convenção define as condutas consideradas como genocídio (o assassinato e dano grave à integridade mental do grupo, por exemplo), assim como estabelece outras que por estarem ligadas a esse crime também são passíveis de punição (como por exemplo, a tentativa de genocídio e a cumplicidade no genocídio). 
O documento define ainda as pessoas que podem ser punidas pela prática de tal crime (governantes, funcionários ou particulares), e a quem cabe a competência de julgá-las (o Estado onde cometeu-se o genocídio ou a corte penal internacional competente); Celso MELLO critica esse último ponto ao colocar que "a Corte Internacional Criminal não existe e, por outro lado, estes crimes são cometidos normalmente em ditaduras, o que significa não terem os tribunais internos qualquer autonomia para julgar os criminosos, normalmente, homens do governo." 

Tribunais Internacionais

Para se combater a situação de ineficiência nos mecanismos de proteção internacional aos direitos humanos, há muito vem se discutindo a criação e tribunais internacionais efetivos e permanentes, e não temporários como os de Nuremberg e Tóquio, com capacidade real para julgar os crimes que vão de encontro ao Direito Internacional, em especial os contra a humanidade. 
Essa aspiração tem-se tornado cada vez mais próxima da realidade, sobretudo com a criação do Tribunal Penal Internacional na Conferência Diplomática de Plenipotenciários das Nações Unidas sobre o Estabelecimento de um Tribunal Penal Internacional, realizado na cidade de Roma nos meses de junho e julho de 1998.
Evidentemente não se pode prever quando o Tribunal vai começar suas atividades. 
Atualmente, seis Estados ratificaram o Estatuto e noventa e quatro já assinaram-no, sendo que o quorum exigido para sua entrada em vigor é de sessenta Estados ratificastes. 
Com sede em Haia, na Holanda, o Tribunal terá capacidade jurídica internacional para o exercício de manutenção de sua finalidades, inclusive a celebração de tratados com outras organizações internacionais ou com Estados. 
Como principais objetivos do Tribunal: 
1. possibilitar que se leve a julgamento indivíduos (não Estados), que tenham cometido crimes como o genocídio, crimes de guerra e crimes contra a humanidade, acabando com a impunidade dos grandes violadores dos direitos da pessoa humana, em termos repressivos e preventivos; 
2. sanar os possíveis insucessos das Cortes Nacionais, que deixam impunes criminosos, principalmente quando estes são autoridades políticas ou militares; 
3. mitigar limitações políticas e jurídicas inerentes aos tribunais internacionais criminais ad hoc, como a instalação em alguns casos e não em outros, a parcialidade e o perigo de excesso de tribunais instaurados, sem consistência na interpretação e aplicação do Direito Internacional, já que são criados para uma situação específica, e com um corpo de juízes distinto. 
fonte: Portal JUS

Direito Internacional Humanitário e Direito dos Refugiados




























O Direito Internacional Humanitário (DIH) e outros regimes jurídicos são complementários em situações de conflito armado. No entanto, são sistemas distintos. 
A diferença mais importante é a que se estabelece entre o jus in bello (ou DIH), que regula a forma como as hostilidades são conduzidas, e o jus ad bellum, que se refere aos motivos da guerra. 
Em alguns aspectos, existem superposições entre o DIH, o Direito Internacional dos Direitos Humanos e o Direito dos Refugiados.

Direito Internacional Humanitário

Tradicionalmente, o DIH protege a pessoa humana em conflitos armados e o DIDH em todos os tempos; todavia, “mais recentemente o primeiro tem-se voltado também para situações de violência em conflitos internos, e o segundo à proteção de certos direitos básicos também em diversas situações de conflitos e violência.”

Entende-se como elementos característicos do DIH,  

“corpo de normas jurídicas de origem convencional ou consuetudinário, especificamente aplicável aos conflitos armados, internacionais ou não-internacionais, e que limita, por razões humanitárias, o direito das partes em conflito de escolher livremente os métodos e os meios utilizados na guerra, evitando que sejam afetados as pessoas e os bens legalmente protegidos.” 
Se a guerra é o campo do conflito, por que será que existem normas que regulamentam as condutas perpetuadas nesse período? Haveria uma contradição entre conflito e regras a serem cumpridas? A resposta é não. A normatização do conflito visa precisamente à mitigação de seus efeitos e a sua não transformação em uma barbárie absoluta.
Tendo em vista que a Carta das Nações Unidas legitima expressamente o uso da força em circunstâncias limitadas, é preciso compreender algumas limitações acordadas pelos Estados de forma a tornar os conflitos armados menos danosos, notadamente no que se refere à proteção da pessoa humana.


Histórico DIH

O DIH pode ser indicado como precursor da internacionalização da proteção da pessoa humana. 
O enquadramento moderno é marcado pela Convenção de Genebra de 1864 para melhoramento da condição de feridos no campo. É importante lembrar que nesse momento, o mundo era formado por poucos Estados e não existiam instâncias multilaterais que pudessem monitorar o uso da força. 
Esse esforço normativo é resultado da barbárie vivenciada nos campos de guerra existentes na Europa durante o século XIX. 
Em 1859, o genebrino Henry Dunant presenciou as atrocidades da batalha de Solferino, norte da Itália, entre franceses e austríacos. Publicou, em 1862, o livro “Recordações de Solferino”, no qual propõe a criação de entidades de socorro privadas em cada país e a elaboração de um acordo internacional que facilitasse o trabalho das mesmas. 
Em 1863, em companhia de outros genebrinos, Dunant fundou o Comitê Internacional de Ajuda aos Feridos, o qual veio a ser chamado logo após de Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV). 
A convite do governo suíço, foi celebrada uma conferência no ano de 1864 que aprovou o Convênio para a proteção dos feridos no campo, que, em seus 10 artigos, estabeleceu o marco normativo moderno do DIH.
Tal passo não foi suficiente para evitar os resultados trágicos das duas Grandes Guerras Mundiais. Era necessário um compromisso mais efetivo por parte dos Estados para o estabelecimento de uma ordem mundial pós-1945. 
Por iniciativa do CICR, a Suíça convocou uma conferência em Genebra no ano de 1949, da qual resultaram os diplomas que constituem a chave-mestra do DIH:
• Convenção de Genebra I - protege os feridos e doentes das Forças Armadas em campanha;
• Convenção de Genebra II - protege os feridos, doentes e náufragos das Forças Armadas no mar;
• Convenção de Genebra III - protege os prisioneiros de guerra; e
• Convenção de Genebra IV - inaugura a preocupação com a população civil.

A extensão de sua aplicabilidade e a ratificação por parte de 191 países fazem com que o DIH seja denominado muitas vezes de o “Direito de Genebra”. 
Todavia, a preocupação com as guerras de libertação nacional e a necessidade de regulamentação dos conflitos armados não-internacionais conduziram ao chamamento de uma conferência internacional em 1977, realizada também em Genebra, para a elaboração de dois protocolos adicionais às Convenções de Genebra.
• Protocolo Adicional I – em nome do princípio da auto-determinação dos povos, o Protocolo Adicional I amplia a definição de conflito armado internacional por incorporar aqueles nos quais se luta contra regimes de dominação colonial ou contra regimes racistas, tendo sido ratificado por 161 países; e
• Protocolo Adicional II – disciplina a previsão do artigo 3º comum e sua aplicabilidade a conflitos armados internos. Condições: forças armadas dissidentes ou outros grupos armados organizados, sob comando responsável e exercendo controle sobre certa parte do território. O Protocolo II foi ratificado por 156 países.

As convenções e o Protocolo I são aplicáveis a conflitos armados, o que significa o envolvimento de dois ou mais Estados. Importante ressaltar que a aplicabilidade de tais normas não está condicionada à declaração formal de guerra, bastando o fato de um conflito armado. Por sua vez, o Protocolo II e o Artigo 3 comum às Convenções, também denominado “mini-convenção” são aplicáveis a conflitos armados não-internacionais.
De acordo com gráficos apresentados no site do CICV, é possível enumerar os princípios regedores do DIH:
  1. Somente podem ser atacados os objetivos militares.
  2. Recolher e dar assistência aos feridos aos doentes e aos náufragos, sem discriminação alguma.
  3. Tratar com humanidade o adversário que se rende ou é capturado, assim como os prisioneiros ou detidos.
  4. Respeitar os civis e seus bens.
  5. Não causar sofrimentos ou danos excessivos.
  6. Não atacar o pessoal médico ou sanitário nem suas instalações e permitir que façam seu trabalho.
  7. Não colocar obstáculos ao pessoal da Cruz Vermelha no desempenho de suas funções.
De acordo com o artigo 38 da Convenção I de Genebra, em homenagem à Suíça, o sinal heráldico da cruz vermelha em fundo branco, formado pela inversão das cores federais, é mantido como emblema e sinal distintivo do serviço de saúde dos exércitos. 
Estabelece ainda que, para os países que empregam já como sinal distintivo, em vez da cruz vermelha, o crescente vermelho ou o leão e o sol vermelhos em fundo branco, estes emblemas são igualmente reconhecidos nos termos da presente Convenção.


Aplicabilidade do DIH

Ao assinar um tratado de DIH, o Estado obriga-se não apenas às normas nele constantes, mas também a adequar a sua legislação interna de forma a compatibiliza-la, notadamente no que se refere às normas de caráter penal comum e militar e processual penal comum e militar. 
Assume ainda a obrigação de adotar medidas preventivas, como a de difusão do conteúdo dos tratados, seja em tempo de paz ou de guerra, em especial a autoridades civis e militares.
Igualmente, deve assegurar medidas de controle, fundamentais à determinação de infrações às normas de DIH: tendo em vista a necessidade de se estabelecer uma autoridade neutra capaz de arbitrar um conflito armado, o direito consuetudinário reconheceu, por meio da nomenclatura ‘Potência Protetora’, a designação de um Estado alheio ao conflito. 
Tal instituição foi consagrada pela Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas de 1961. Considerada a dificuldade de eleição de tal Estado, o Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) acaba por agir como substituto da potência. 
Por sua vez, o Protocolo I de 1977 convencionou a criação da Comissão Internacional de Apuramento dos Fatos, instituição imparcial capaz de acompanhar a veracidade das alegadas violações ao DIH.

Por fim, é também tarefa do Estado estabelecer medidas de repressão, uma vez que a violação das regras de DIH corresponde à violação de regras de caráter interno, notadamente penal e processual, seja comum ou militar. 
Nesse sentido, o Estado deve envidar todos os esforços para cessar condutas que afrontam o DIH e deve punir os autores de condutas adversas a esse direito.

Direitos Humanos e Direito dos Refugiados

A globalização econômica desnuda um paradoxo: por um lado, as fronteiras estatais diminuem no que concerne a mercadorias, serviço e principalmente a capitais; por outro, nunca estiveram tão altas no que concerne a pessoas. 
Vivencia-se hoje um enorme fluxo migracional, causado muitas vezes pelas próprias decorrências do capitalismo que não encontra nas fronteiras a mesma flexibilidade.

É claro que o ‘deslocar-se’ faz parte da história, mas foi o final da Segunda-Guerra Mundial o marco inaugural para o abrigo internacional a sua proteção, em determinadas situações, no contorno específico da figura do refugiado.

A proteção ao refugiado encontra abrigo no marco fundamental dos direitos humanos: assinada em 1948, a Declaração Universal dos Direitos Humanos estabelece que toda pessoa vítima de perseguição tem o direito de procurar e de gozar asilo em outros países. Nesse sentido, 134 países comprometeram-se com a causa no momento da assinatura da Convenção sobre o Estatuto dos Refugiados de 1951 e do Protocolo de 1967.

A Convenção estabeleceu a definição clássica de refugiado como qualquer pessoa que:
(...) em conseqüência de acontecimentos acorridos antes de 1o. de janeiro de 1951 e temendo ser perseguida por motivo de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas, se encontra fora do país de sua nacionalidade e que não pode ou, em virtude desse temor, não quer valer-se da proteção desse país ou que, se não tem nacionalidade e se encontra fora do país no qual tinha sua residência habitual em conseqüência de tais acontecimentos não pode ou, devido ao referido temor, não quer voltar a ele.

O Direito Internacional dos Refugiados vem galgando importantes passos ao longo de sua história. Originalmente, “criado em um contexto de Guerra Fria, este conceito tem como centro a questão da perseguição, o que se coaduna perfeitamente à dualidade de sistemas vivenciada no pós-guerra: os refugiados podiam ser vistos como troféus de um sobre o outro.” 
Há de se destacar que a concepção clássica de refúgio, concebida no descrito contexto, caracteriza-se como subjetiva e individual, tendo como base a idéia de perseguição. Todavia, a realidade internacional demonstrou a incapacidade desse conceito jurídico em dar uma resposta a situações fáticas, erigindo a necessidade de revisão do conceito do refúgio.

A primeira iniciativa de ampliação encontra-se na Convenção da Organização da Unidade Africana, aprovada em 1969, entrando em vigor em 1974. Estabelece, em seu artigo 1, inciso 2:
2. O termo “refugiado” aplicar-se-á também a toda pessoa que, por causa de uma agressão exterior, uma ocupação ou uma dominação estrangeira ou de acontecimentos que pertubem gravemente a ordem pública em uma parte ou na totalidade de seu país de origem, ou do país de sua nacionalidade, está obrigada a abandonar sua residência habitual para buscar refúgio em outro lugar for do seu país de origem ou do país de sua nacionalidade.

A ampliação do conceito também teve palco no continente americana, adaptando-no à realidade regional, por ocasião da Declaração de Cartagena de 1984. Em sua terceira conclusão, estabelece que:
(...) faz-se necessário encarar a extensão do conceito de refugiado, tendo-se em conta, no pertinente, e dentro das características da situação existente na região, o precedente da Convenção da OUA (artigo 1, parágrafo 2) e a doutrina utilizada nos informes da Comissão Interamericana de Direitos Humanos. desse modo, a definição ou conceito de refugiado recomendável para sua utilização na região é aquela que além de conter os elementos da Convenção de 1951 e do Protocolo de 1967, considere também como refugiados as pessoas que fugiram de seus países porque sua vida, segurança ou liberdade foram ameaçadas pela violência generalizada, a agressão estrangeira, os conflitos internos, a violação massiva dos direitos humanos ou outras circunstâncias que tenham perturbado gravemente a ordem pública.

Cumpre ressaltar que os países americanos reiteram a perspectiva ampliada do conceito de refúgio no ano de 1994, uma década depois de Cartagena, por ocasião da Declaração de San José. Esta declaração aprofundou as relações entre o DIR e o DIDH ao tratar de forma mais aprofundada questões deslocamentos forçados.

Tanto a concepção africana quanto a americana demonstram como a realidade conduziu a necessidade de adequação da Convenção de 1951. Percebe-se uma clara objetivação do conceito de refúgio, o qual deixa de ter a idéia de perseguição como fundamental. 
De acordo com Cançado Trindade, “vem-se passando gradualmente de um critério subjetivo de qualificação de indivíduos, segundo as razões que os teriam levado a abandonar seus lares, a um critério objetivo concentrado antes nas necessidades de proteção.” 
Os conceitos descritos conduzem ainda à premissa que permeia a presente aula. Não se pode mais alimentar a compartimentalização da proteção da pessoa humana. Afinal, resta claro que o DIR e o DIDH passam a ter não apenas progressiva interação, mas a violação de direitos humanos assume a condição de situação que acarreta refúgio.
Nesse sentido, o DIDH deve contracenar com o DIR em três momentos: prevenção, proteção e solução. É precisamente nesse sentido que se constrói a estratégia do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR). 
“A visão tradicional concentrava atenção quase que exclusivamente na etapa intermediária de proteção (refúgio); foram as necessidades de proteção que levaram o ACNUR, nos últimos anos, a ampliar seu enfoque de modo a abranger também a etapa ‘prévia’ de prevenção e a etapa ‘posterior’ de solução duradoura (repatriação voluntária, interação local, reassentamento).”

No que se refere à etapa preventiva, violações maciças de direitos humanos e conflitos armados podem ser indicados por fatores determinantes para a saída de determinados grupos de um país, constituindo campo de implantação concomitante do DIDH e do DIH. 
Por sua vez, a etapa da proteção tem no princípio do non refoulement sua principal viga. 
Por fim, no que concerne à solução duradoura, cabem alguns esclarecimentos: ultrapassada a concessão de refúgio por órgão independente e especializado, deve ser estipulada uma solução considerada duradoura para os refugiados. 
Dentre elas, destaca-se a integração local, cabendo ao Estado todas as providências necessárias para o exercício dos direitos humanos por parte dos refugiados, como educação e trabalho. Cabe também a repatriação, sendo absolutamente necessária a anuência do refugiado, de forma a garantir o princípio do non refoulement. 
Por fim, há também o reassentamento quando o refugiado vai para um terceiro país.

Todavia, nem todas as pessoas que têm que deixar seus lares cruzam as fronteiras. Por mais que as condições que expulsam os refugiados e os deslocados de seus lares possuam o mesmo cerne - afirmativa que encontra respaldo no conceito objetivo de refugiados - somente aquele que cruza a fronteira pode perquirir o status de refúgio. 
Originalmente criado com tarefa restritiva aos refugiados, o ACNUR tem desenvolvido diversas atividades que contemplam os deslocados, apátridas, solicitantes de asilo e retornados.

O ACNUR estimava que no final de 2008 estava auxiliando 14,4 milhões dos 26 milhões de deslocados internos existentes no mundo, espalhados em 22 países, incluindo os três países com o maior número de deslocados internos do mundo: Sudão, Colômbia e Iraque . 
Dados de 2010 demonstram que o ACNUR fornece proteção e assistência para cerca de 32 milhões de pessoas em todo o mundo, incluindo refugiados, solicitantes de refúgio, deslocados internos, repatriados e apátridas.

Por fim, cabem aqui algumas ponderações sobre os refugiados no Brasil. Como ilustrado o terceiro texto inicial da Nota ao Aluno, o Brasil recebe hoje milhares de refugiados. O diagnóstico das nacionalidades vêm sofrendo alterações ao longo dos anos. 
Como ressalta Guilherme de Almeida, em retrospectiva histórica, ao incorporar a Convenção sobre o Estatuto dos Refugiados de 1951, o Decreto nº 50.215, de 28 de janeiro de 1961, estabelece uma “reserva” geográfica, a qual estipula o Brasil aceitaria somente refugiados originados do continente europeu. 
Tal cláusula fez com que, até que fosse levantada em 1989, alguns grupos fossem recebidos com outro título, como foi o caso de 150 vietnamitas em 1979/80 e 50 famílias Bahai (Irã) em 1986. 
Entre os anos de 1992 e 1994, o Brasil recebe cerca de 1200 angolanos. Interessante ressaltar que, mesmo em momento anterior à elaboração da Lei nº 9747/97 que abrigou tanto a concepção clássica quanto a ampliada de refugiado, o Estado brasileiro aceitou as vítimas da guerra civil angolana com base na Declaração de Cartagena.  
De acordo com a tabela abaixo, é possível vislumbrar o atual retrato dos refugiados no Brasil: 

Tabela 1 - Total de Refugiados no Brasil em fevereiro de 2005 
(ACNUR E CONARE)

CONTINENTE DE PROCEDÊNCIA / TOTAL
África 2.506
América (América Latina e Caribe) 274
Ásia 181
Europa 113

Total
3074
Fonte: CONARE

Tais números refletem os pedidos de refúgio acolhidos antes e depois de 1998, momento de constituição do Comitê Nacional para Refugiados (CONARE). Órgão coletivo sediado no Ministério da Justiça, o CONARE é responsável pelo exame das solicitações de refúgio e pela elaboração de políticas públicas para os refugiados.

Fica clara a preponderância de refugiados de origem africana. Todavia, há de se ressaltar que nos últimos anos, torna-se significativo o número de refugiados latino-americanos, notadamente provenientes da Colômbia.

O Relatório do CONARE de 2009 corrobora a informação acima. De acordo com o relatório, o Brasil possui 4.131 refugiados de 72 países, em sua maioria africanos. Em 2009, 67% das pessoas que ganharam esse status no Brasil são africanas, sendo 42% do total de nacionalidade angolana. 
O número que mais cresce de refugiados no Brasil é o de colombianos, que, com 551 pessoas, representa 13,4%. Em seguida encontramos os cidadãos da República Democrática do Congo, na África, com 359; da Libéria, com 259; e do Iraque, com 188.

A contabilidade de refugiados e deslocados está recortada a um determinado período histórico. É certo que a ampliação da definição constitui uma forma de se contemplar grupos que tiveram que deixar seus lares por diferentes razões. 
Da mesma forma, organizações internacionais como o ACNUR tiveram que expandir o universo de grupos sob sua responsabilidade, como é o caso dos deslocados. 
Todavia, a elasticidade conceitual deve ser respeitada pela aplicação de medidas preventivas que evitem que refugiados e deslocados tenham que dar início à partida.

Situação atual de refugiados no Brasil
O Comitê Nacional para os Refugiados (Conare), ligado à Secretaria Nacional de Justiça do Ministério da Justiça (SNJ/MJ), reconheceu, até outubro de 2014, um número doze vezes maior de refugiados que em 2010. 
As informações são do relatório “Refúgio no Brasil: análise estatística”, publicado pelo Alto Comissariado das Nações Unidas (Acnur) com dados oficiais do Conare.
O Conare deferiu 88,5% das solicitações de refúgio apreciadas este ano, uma taxa de elegibilidade mais que duas vezes a de 2013 e a maior desde 2010, quando o órgão começou o controle dos dados.
As solicitações de refúgio saltaram de 566, em 2010, para 8.302, somente em 2014.
“Com maior visibilidade internacional, o Brasil tem sido destino de novos deslocamentos transcontinentais”, explica Paulo Abrão, presidente do Conare e secretário Nacional de Justiça, referindo-se ao grande número de sírios entre os 7.289 refugiados no Brasil.
Um relatório mais detalhado e atualizado sobre os refugiados no Brasil está disponível no post sobre Dados sobre Refugiados no Brasil aqui no Missão Diplomática.  

           3. Portal Brasil

Dados sobre Refugiados no Brasil



Análise Estatística sobre refugiados no Brasil entre 2010 e 2014 
O Brasil é signatário dos principais tratados internacionais de direitos humanos e é parte da Convenção das Nações Unidas de 1951 sobre o Estatuto dos Refugiados e do seu Protocolo de 1967. 
O país promulgou, em julho de 1997, a sua lei de refúgio (nº 9.474/97), contemplando os principais instrumentos regionais e internacionais sobre o tema. A lei adota a definição ampliada de refugiado estabelecida na Declaração de Cartagena de 1984, que considera a “violação generalizada de direitos humanos” como uma das causas de reconhecimento da condição de refugiado. 
Em maio de 2002, o país ratificou a Convenção das Nações Unidas de 1954 sobre o Estatuto dos Apátridas e, em outubro de 2007, iniciou seu processo de adesão à Convenção da ONU de 1961 para Redução dos Casos de Apatridia. 
A lei brasileira de refúgio criou o Comitê Nacional para os Refugiados (CONARE), um órgão interministerial presidido pelo Ministério da Justiça e que lida principalmente com a formulação de políticas para refugiados no país, com a elegibilidade, mas também com a integração local de refugiados. 
A lei garante documentos básicos aos refugiados, incluindo documento de identificação e de trabalho, além da liberdade de movimento no território nacional e de outros direitos civis. 
De acordo com o CONARE, o Brasil possui atualmente (em outubro de 2014) 7.289 refugiados reconhecidos, de 81 nacionalidades distintas (25% deles são mulheres) – incluindo refugiados reassinados. 
Os principais grupos são compostos por nacionais da Síria, Colômbia, Angola e República Democrática do Congo (RDC). 
Este perfil vem mudando gradualmente desde 2012, quando o país adotou uma cláusula de cessação de refúgio aplicável aos angolanos e liberianos, com base em orientação global expedida pelo ACNUR em junho do mesmo ano. 
Conforme a portaria do Ministério da Justiça nº 2.650 (de outubro de 2012), estes estrangeiros estão recebendo a residência permanente no país, em substituição ao status de refugiado.
Com base em dados do CONARE referentes ao período entre janeiro de 2010 e outubro de 2014, o ACNUR elaborou uma análise estatística que demonstra o fortalecimento continuado da proteção aos refugiados e solicitantes de refúgio no Brasil [1]
O número total de pedidos de refúgio aumentou mais de 930% entre 2010 e 2013 (de 566 para 5.882 pedidos). Até outubro de 2014, já foram contabilizadas outras 8.302 solicitações. A maioria dos solicitantes de refúgio vem da África, Ásia (inclusive Oriente Médio) e América do Sul. 
Também o número de refugiados reconhecidos aumentou expressivamente no período mencionado. 
Em 2010, 150 refugiados foram reconhecidos pelo CONARE, enquanto em 2014 (até outubro), houve 2.032 deferimentos pelo Comitê, o que representa um crescimento aproximado de 1.240%. 
Desta forma, apesar de haver se mantido estável de 2010 a 2012 (em torno de 4.000), a população de refugiados no Brasil vem crescendo de forma acelerada entre 2013 e 2014 (até outubro), quando atingiu 5.256 e 7.289 indivíduos, respectivamente.
Este perfil sofreu alterações ao longo dos anos com o aumento das solicitações feitas por sírios e a diminuição de solicitações realizadas por colombianos. O caso dos sírios pode ser explicado pela postura solidária do Brasil com as vítimas do conflito naquele país, inclusive por meio da aprovação da Resolução Normativa nº17 do CONARE. 
Tal resolução facilita a entrada no Brasil de quem queira solicitar refúgio em decorrência do conflito sírio, por meio da emissão de um visto de turista válido por 90 dias. 
A redução de solicitações de refúgio feitas por colombianos deve-se em parte aos avanços da negociação de paz entre o governo da Colômbia e as FARC, mas principalmente pela adesão da Colômbia ao Acordo de Residência do Mercosul. 
Este acordo facilita aos colombianos a obtenção de residência temporária no Brasil por um período de 02 anos, que posteriormente pode ser convertida em residência permanente. A partir do ano de 2013, a maioria dos colombianos que chegou ao Brasil solicitou residência com base no Acordo do MERCOSUL. 
Consequentemente, em julho de 2014 o número de refugiados sírios ultrapassou o de colombianos, tornando-se a principal nacionalidade dos refugiados que vivem no Brasil. 
Outros países relevantes entre os solicitantes de refúgio são Senegal, Gana e Nigéria. 
Isto revela a intensificação dos fluxos mistos, já que a maioria dos solicitantes destes países é, na realidade, migrantes que deixaram seus países por causas econômicas – embora haja uma minoria de refugiados. 
Nos últimos anos, todas as importantes crises humanitárias impactaram diretamente os mecanismos de refúgio no Brasil, com expressivos números de solicitantes da Síria, Líbano [2] e RDC chegando ao país.
Em termos de gênero e idade, os dados do CONARE demonstram que o percentual de mulheres diminuiu de 20% (em 2010 e 2011) para 10% (em 2013), se mantendo estável em 2014. A metade dos solicitantes de refúgio é formada por adultos entre 18 e 30 anos. Apenas 4% dos pedidos são apresentados por menores de 18 anos, dos quais 38% correspondem a crianças entre 0 e 5 anos. 
Para implementar seu mandato, que é o de contribuir para que os Estados cumpram seus compromissos internacionais de prestar proteção internacional e promover soluções duradouras para refugiados e outras populações de interesse, o ACNUR conta no Brasil com um escritório-sede em Brasília e duas unidades em São Paulo, que cuidam, respectivamente, da proteção e integração de refugiados e da arrecadação de fundos privados. 
A agência trabalha em estreita parceria com o governo (nos âmbitos federal, estadual e municipal), o setor privado e organizações da sociedade civil que operam em regiões estratégicas do país. 
Os projetos do ACNUR que prestam assistência humanitária aos solicitantes de refúgio e refugiados são implementados por ONGs parceiras localizadas nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Amazonas e Distrito Federal. 
Em 2014, a maioria das solicitações de refúgio no Brasil foi apresentada em São Paulo (26% do total de solicitações no período), Acre (22%), Rio Grande do Sul (17%) e Paraná (12%). Regionalmente, estão concentradas nas regiões Sul (35%), Sudeste (31%) e Norte (25%).
Todas as solicitações de refúgio apresentadas no Brasil são analisadas e decididas pelo CONARE, que é composto por representantes dos ministérios da Justiça, das Relações Exteriores, da Educação, do Trabalho e da Saúde, além de representantes da Polícia Federal e de organizações da sociedade civil que trabalham com o tema dos refugiados. 
O ACNUR é parte do comitê, apenas com direito a voz. Desde 2012, a Defensoria Pública da União tem participado das reuniões do CONARE, com direito a voz – conforme Memorando de Entendimento assinado com o comitê. 
A análise dos dados do CONARE também revela uma melhora no desempenho e
produtividade do comitê. 
O número de solicitações processadas aumentou expressivamente em um período de três anos, saindo de 323 em 2010 para 479 em 2011, 904 em 2012, 6.067 em 2013. 
Naquele ano, 1.585 solicitações foram analisadas no mérito, e o restante foi encaminhado para o Conselho Nacional de Imigração (CNIg). 
Até setembro de 2014, foram analisados 2.206 casos no mérito, número consideravelmente superior aos anos anteriores. 
A taxa de elegibilidade registrada até outubro de 2014 é a mais alta desde 2010, quando foi de 38,4%. Após um decréscimo em 2011 (21,5%), a taxa voltou a subir, chegando a 40,8% em 2013. 
Em 2014, a taxa de elegibilidade está em 88,5%, o que pode ser explicado em parte pelo alto índice de deferimentos das solicitações de refugiados originários da Síria. Sem contabilizar os refugiados sírios, a taxa de elegibilidade de 2014 é de 75,2%. 
Em 2014, o CONARE reconheceu solicitações de refúgio de 18 países diferentes, como Síria, Líbano, RDC e Mali, demonstrando sensibilidade às principais crises humanitárias da atualidade. Desde 2013, praticamente 100% das solicitações apresentadas por nacionais da Síria foram reconhecidas.
Entre os refugiados reconhecidos pelo Brasil, os sírios representam o maior grupo, com 20% do total. Em seguida estão os refugiados da Colômbia, de Angola e da República Democrática do Congo. Outras populações relevantes são os refugiados do Líbano, Libéria, Palestina, Iraque, Bolívia e Serra Leoa. 
Até setembro deste ano, existem 8.687 casos ainda em tramitação no CONARE, sendo 2.164 do Senegal, 1.150 da Nigéria, 1.090 de Gana e 571 da República Democrática do Congo. Dentre o total de solicitações pendentes, 41 foram submetidas em 2011, 176 em 2012, 1.340 em 2013 e 7.130 em 2014. 
Comprometido com o princípio da solidariedade internacional, o Brasil tem exercido papel fundamental no desenvolvimento e implantação do Programa de Reassentamento Solidário na América Latina, como parte do Plano de Ação do México. 
Desde 2002, o Brasil reassentou mais de 612 refugiados (colombianos, em sua maioria), dentre os quais 46% são mulheres. Também há grupos de refugiados vindos de outros continentes. Em 2014, foram aceitos no Programa de Reassentamento refugiados do Sri Lanka e da Síria. 
Nos próximos anos, o Brasil planeja expandir seu programa de reassentamento para um maior número de casos extracontinentais, de modo a oferecer acolhida para refugiados deslocados de outras regiões.
Além de oferecer um ambiente de proteção favorável aos refugiados, o Brasil tem apoiado consistentemente as iniciativas do ACNUR em promover a proteção internacional em diferentes fóruns. 
Em dezembro de 2010, celebrando o 60º aniversário do ACNUR, o país sediou um encontro governamental onde 18 países da América Latina se comprometeram a se engajar mais na proteção das vítimas de deslocamentos forçados e de apátridas na região. O compromisso foi estabelecido na “Declaração de Brasília para Proteção de Refugiados e Apátridas nas Américas”. 
Ao final de 2012, o Brasil liderou dentro do MERCOSUL, em âmbito ministerial, a adoção da “Declaração de Princípios Internacionais de Proteção dos Refugiados”. 
O documento reafirma o princípio da não devolução (non-refoulement), a importância da reunificação familiar e a priorização das abordagens de idade, gênero e diversidade. 
A Declaração também enfatiza a importância de se evitar políticas migratórias restritivas e a necessidade de estabelecer mecanismos de cooperação adicionais e novas formas complementares de proteção humanitária.
Nos dias 2 e 3 de dezembro de 2014, em reconhecimento à sua importância regional, o Brasil sediará o evento comemorativo dos 30 anos da Declaração de Cartagena sobre a Proteção Internacional de Refugiados de 1984. 
A reunião concluirá um longo processo de consultas aos governos e à sociedade civil da América Latina e do Caribe, com o apoio do ACNUR, que incluiu reuniões em Buenos Aires, Quito, Manágua e Ilhas Cayman, além de negociações em Genebra com o GRULAC (Grupo da América Latina e do Caribe). 
O evento culminará com adoção da Declaração e Plano de Ação do Brasil, que renovará os compromissos da região frente aos refugiados e apátridas durante a próxima década. 
Em termos de apoio financeiro às contribuições para as operações humanitárias do ACNUR ao redor do mundo, o Brasil se consolidou como o principal doador do ACNUR entre os países emergentes, com US$ 3,5 milhões doados em 2010, US$ 3,7 milhões em 2011, US$ 3,6 milhões em 2012 e US$ 1 milhão em 2013. 

[1] Estes dados não incluem informações relacionadas aos nacionais do Haiti que chegaram ao Brasil desde o terremoto de 2010. Apesar de solicitarem o reconhecimento da condição de refugiado ao entrarem no território nacional, seus pedidos foram encaminhados ao Conselho Nacional de Imigração (CNIg), que emitiu vistos de residência permanente por razões humanitárias. De acordo com dados da Polícia Federal, mais de 39.000 haitianos entraram no Brasil desde 2010 até setembro de 2014. 
[2] Embora o Líbano não esteja em situação de conflito interno, o elevado número de refugiados sírios no país, que já ultrapassa 1.173.617, tem tido um impacto expressivo na sociedade libanesa. 

fonte: ACNUR

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