sexta-feira, 25 de julho de 2014

China e o Padrão Ouro


Com expansão econômica, China está próxima de adotar padrão-ouro
Apesar do 70º aniversário do Dia D, no mês passado, ter recebido muita atenção, outro evento, em julho de 1944 -- a conferência de Bretton Woods, que levou o nome da cidade montanhesa em New Hampshire onde foi realizada -- talvez tenha sido ainda mais significativo na moldagem do mundo moderno. 

Ele não apenas levou à criação daqueles que são conhecidos hoje como Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial, mas também confirmou a posição central do dólar dos Estados Unidos no sistema monetário internacional.

Por que isso importa para nós agora? Assim como os Estados Unidos substituíram o Reino Unido como potência econômica mais proeminente do mundo no período entre as guerras, as grandes dívidas e pressões fiscais enfrentadas pelo Ocidente, e a ascensão da China e de outras potências econômicas, nos desafiam a pensar no futuro das finanças.

Durante grande parte do século 19, a libra britânica foi a "moeda de reserva" do mundo, a moeda na qual o comércio e as finanças eram denominados. "Tão seguro quanto a libra" se tornou uma expressão amplamente usada. A libra era atrelada ao ouro a uma taxa fixa de pouco menos de 4 libras por onça.

No início da Primeira Guerra Mundial, o Reino Unido abandonou o padrão-ouro. Você não podia mais trocar libras por ouro. O padrão-ouro foi reintroduzido em 1925, mas isso, como observou John Maynard Keynes, provou ser um erro econômico.

Os preços britânicos e, mais importante, os salários teriam que sofrer uma redução forçada de 10% para manter a competitividade das exportações britânicas. À medida que as exportações agrícolas e industriais americanas cresciam nos anos 20 e 30, o dólar substituiu na prática a libra. Foram os banqueiros americanos que socorreram a falida República de Weimar nos anos 20. Os britânicos, como exportadores de capital, eram uma força decrescente.

Na época de Bretton Woods, os Estados Unidos contavam com cerca de 60% das reservas de ouro do mundo. "Pense no ouro no Forte Knox", disse o negociador-chefe dos Estados Unidos em Bretton Woods, Harry Dexter. "Esse é o motivo para estarmos em uma posição poderosa." Ele acrescentou: "Temos os meios para comprarmos qualquer moeda que quisermos".

Bretton Woods fixou o preço em dólares do ouro a US$ 35 por onça, e todas as outras moedas importantes --a libra, o franco, o marco, o iene-- foram posteriormente atreladas ao dólar, apesar de não poderem ser trocadas diretamente por ouro. Esse sistema durou até 1971. Na época, os Estados Unidos estavam sob a pressão financeira da Guerra do Vietnã e da Grande Sociedade de Lyndon B. Johnson. 


Com crescentes déficits e balança comercial adversa, os Estados Unidos tinham dificuldade em manter a conversão ao ouro na velha taxa de US$ 35 a onça. Assim, o presidente Richard M. Nixon abandonou o preço fixo do ouro em dólares estabelecido em Bretton Woods (apesar das objeções do presidente do Federal Reserve --Fed, o banco central americano-- Arthur F. Burns).

Os críticos internacionais disseram que os Estados Unidos, ao acabarem com o elo do dólar com o ouro, estavam dando as costas às suas responsabilidades como avalistas do sistema monetário internacional. Ao longo das décadas, a situação piorou. Os Estados Unidos têm uma dívida pública de US$ 17,6 trilhões e grandes déficits comerciais passaram ser a norma. 


Mas não há movimentação para uma revisão do sistema monetário internacional, apesar da grande insatisfação de países como a China e os Estados do Golfo Pérsico, que contam com grandes reservas de moedas estrangeiras. Os próprios americanos questionam a segurança do dólar quando seu país enfrenta grandes déficits comerciais e orçamentários.

Os quase US$ 4 trilhões em reservas da China --acumulados por meio de suas políticas de comércio mercantilistas-- lhe dão bastante munição para reivindicar a liderança na criação de uma nova ordem monetária. Nos últimos 25 anos, ela têm buscado uma política de crescimento agressivo das exportações como motor de sua economia. 


A China desvalorizou sucessivamente sua moeda, da cotação do dólar a 1,50 yuan em 1980 para 8,72 em 1994. (Hoje, o dólar está cotado a 6,20 yuans, valor que os Estados Unidos ainda consideram artificialmente baixo.)

Poderia a China algum dia atrelar sua moeda ao ouro, como fez o Reino Unido em 1821 ? A China dispõe de reservas para isso, e pode vir a ter a vontade política, caso o dólar prove não ser confiável como reserva de valor no futuro.

É claro, a adoção inicial pelo Reino Unido do padrão-ouro, em 1821, agravou um período deflacionário acentuado, durante o qual, segundo cálculos, os preços ao consumidor caíram quase 50%, entre 1818 e 1822.

Todavia, para seus apoiadores, o padrão-ouro assegurou o domínio fiscal e monetário britânico durante o restante do século 19. Como observou o historiador britânico A.J.P. Taylor, os britânicos do século 19 acreditavam que "um país não poderia prosperar sem um orçamento equilibrado e uma moeda em ouro". 


Desde Keynes, o Ocidente tenta negar essa proposição, com sua confiança em gastos deficitários e moeda sem lastro, apoiada principalmente pela expectativa de que um governo não dará calote em suas dívidas.

A China não está tão endividada quanto o Ocidente, mas está buscando "reequilibrar" sua economia aumentando a demanda pelos consumidores, que desejam desfrutar do padrão de vida do mundo ocidental. Desde 2010, o yuan apresentou valorização de 14% sem ferir drasticamente as exportações chinesas.

Tendo expandido sua base manufatureira e conquistado os mercados internacionais, a China pode encontrar um mundo viciado em seus produtos. Ela poderia eventualmente --em, digamos, 20 anos-- atrelar o yuan ao ouro, o considerando preferível ao dólar como reserva de valor, devido à sua permanência e longevidade. 


Com um orçamento equilibrado e uma moeda tendo ouro como lastro, a economia da China poderia ser ainda mais formidável do que é hoje. Uma medida dessas certamente marcaria o retorno do "Reino Médio". 

É difícil contemplar isso hoje, mas esse cenário seria, de muitas formas, uma base mais segura para um sistema monetário internacional do que o sistema de taxas de câmbio flutuantes que Nixon criou inadvertidamente em 1971, um que derrubou para sempre a ordem de Bretton Woods.

* Kwasi Kwarteng 


fonte: UOL / NY Times

Leia mais sobre o Padrão Ouro aqui no Missão Diplomática nos posts Gold Standard  e  Padrão Dólar-Ouro.

Leia mais sobre o interesse da China em adotar o Padrão Ouro no artigo A Tradição do Ouro

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