terça-feira, 31 de maio de 2016

Mecanismo de coordenação política Brasil-Argentina





























Memorando de Entendimento entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República Argentina para a Criação do Mecanismo de Coordenação Política Brasil-Argentina  

Ministério das Relações Exteriores
23 maio 2016

O Governo da República Federativa do Brasil
e
O Governo da República Argentina
(doravante denominados "Partes"),
No marco das celebrações dos trinta anos da assinatura da Declaração do Iguaçu, em 30 de novembro de 1985, que marcou o início do processo de aproximação entre Brasil e Argentina e resultou na construção de relação marcada pela confiança mútua, pela amizade e pela cooperação, em nome dos ideais de paz, liberdade e justiça social; e dos vinte e cinco anos da criação do MERCOSUL, em 26 de março de 1991, o mais ambicioso processo de integração existente na região, que proporcionou a todos os países integrantes ganhos substantivos em matéria de comércio, indústria, emprego, benefícios sociais e bem-estar;
Conscientes da importância dos laços políticos existentes entre Brasil e Argentina, cuja aliança tem sido determinante para a promoção do desenvolvimento de ambos os países e para o aprofundamento do processo de integração regional, construindo uma América do Sul mais integrada, pacífica e próspera;
Certos de que a crescente integração entre os dois países, que tem resultado em projetos desenvolvidos conjuntamente em áreas estratégicas como ciência, tecnologia e inovação, defesa, infraestrutura, energia e comércio, exige o constante e sistemático acompanhamento, para garantir-lhes a devida celeridade e conferir-lhes prioridade de tratamento na agenda de trabalho dos dois Governos;
Cientes de que a atuação conjunta de Brasil e Argentina no plano internacional fortalece os dois países mutuamente e contribui para a projeção e o fortalecimento da América do Sul no mundo, e que essa atuação exige o constante intercâmbio de opiniões e a coordenação de posições em matérias de interesse comum nos planos regional e global;
e
Reconhecendo os avanços em benefício da integração bilateral proporcionados pelo Mecanismo de Integração e Coordenação Brasil-Argentina (MICBA), instituído em 2007;
Acordam o seguinte:
Fica constituído o Mecanismo de Coordenação Política Brasil-Argentina, coordenado pelas Chancelarias, cujos trabalhos serão presididos pelos Vice-Chanceleres (Secretário-Geral das Relações Exteriores do Brasil e Secretário de Relações Exteriores da Argentina).
1. O Mecanismo de Coordenação Política constituirá o principal foro de coordenação política entre Brasil e Argentina e poderá envolver, além das Chancelarias, outros órgãos dos dois Governos que se julguem pertinentes, os quais serão convocados pelas Chancelarias para participar das reuniões.
2. O Mecanismo terá por principais objetivos o intercâmbio de opiniões sobre temas das agendas bilateral, regional e global, com vistas à coordenação de posições; e o acompanhamento dos projetos estratégicos de integração bilateral, em especial nas áreas de ciência, tecnologia e inovação; defesa; indústria aeronáutica; energia; e comércio, sem prejuízo de outras áreas que possam ser consideradas prioritárias pelos dois Governos.
3. As reuniões do Mecanismo de Coordenação Política serão periódicas e se darão, preferencialmente, no mínimo duas vezes ao ano. Os dois países procurarão realizar, ao menos, uma reunião no início de cada ano, para definir a agenda comum de trabalho; e outra no início do segundo semestre, com enfoque prioritário na coordenação de posições para a Assembleia-Geral das Nações Unidas.
4. A agenda temática do Mecanismo de Coordenação Política será aberta e acordada entre as Chancelarias previamente a cada reunião, de modo a refletir a agenda internacional e os interesses específicos de cada um dos países.
5. As reuniões serão realizadas de forma alternada em cada um dos países. O país anfitrião será responsável pela apresentação de proposta de data, local e agenda do encontro; e deverá submetê-la com antecedência mínima de um mês da reunião.
6. As reuniões do Mecanismo poderão ser organizadas em subgrupos temáticos que trabalharão sobre pontos específicos da agenda, desde que se julgue necessário. Os subgrupos temáticos se reportarão aos Vice-Chanceleres.
7. Os subgrupos temáticos deverão remeter relatórios de atividades, acompanhados de recomendações, para apreciação do Mecanismo.
8. As partes intercambiarão, em prazo não superior a trinta dias, os seus respectivos registros de decisões e medidas de seguimento acordadas nas reuniões.
9. Excepcionalmente, a critério das duas Chancelarias, as reuniões do Mecanismo de Coordenação Política poderão ser presididas pelos Ministros das Relações Exteriores.
10. O Presente Memorando de Entendimento entrará em vigor da data de sua assinatura e terá vigência indefinida.
11. As Partes poderão modificar o presente Memorando de Entendimento, por meio do intercâmbio de notas diplomáticas.
12. Qualquer das Partes poderá denunciar o presente Memorando de Entendimento, mediante notificação por via diplomática, com sessenta (60) dias de antecedência à data em que se decida terminá-lo.
Feito em Buenos Aires, em 23 de maio de 2016, em dois exemplares originais nos idiomas português e espanhol, sendo ambos os textos igualmente autênticos.
fonte: Itamaraty



quarta-feira, 25 de maio de 2016

Itamaraty instrui diplomatas a combater versão de golpe


























Folha SP
25 maio 2016

Embaixadores brasileiros ao redor do mundo receberam nesta terça-feira (24) uma circular instruindo como devem "combater ativamente" as acusações de que o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff tenha sido "golpe".

O documento a que a Folha teve acesso, de autoria do gabinete do ministro José Serra, afirma que "órgãos de imprensa, acadêmicos e membros da sociedade civil, mas também dirigentes de organismos internacionais e representantes de governos, têm-se manifestado, frequentemente de forma imprópria e mal informada, a respeito do [...] processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff".

E, logo depois, completa: "Os equívocos porventura cometidos no tratamento de temas da realidade brasileira por autoridades locais na jurisdição do posto, geradores de percepções erradas sobre o corrente processo político no Brasil, devem ser ativamente combatidos por vossa excelência".

As circulares são usadas para passar informações ou instruções (ordens) a postos no exterior. O texto em questão orienta os diplomatas a esclarecer, "com elementos factuais e jurídicos sólidos, que o processo de impeachment (de Dilma) observa rigorosamente os ditames e ritos previstos na legislação."

Na circular, que foi recebida com surpresa em alguns postos, são compilados trechos de notas das chancelarias de Venezuela, Cuba, Bolívia e El Salvador, além das secretarias-gerais da Unasul e da OEA, que questionaram a legitimidade do processo de impeachment. 

Essas já haviam sido rechaçadas por notas duras do Itamaraty no último dia 13 de maio, que caracterizavam os questionamentos como "falsidades".

"Declarações vagas e sem fundamento sobre a inobservância da legislação brasileira [...] sobretudo emanadas de autoridades governamentais ou de dirigentes de organismos internacionais, precisam ser enfrentadas com rigor e proficiência, a fim de evitar que continuem a fomentar dúvidas infundadas sobre a lisura do processo político no Brasil", diz a circular. 

"Não é admissível que o processo de impeachment seja assemelhado a 'manobras' ou 'farsas políticas'."

RESPOSTAS

O texto segue listando quais devem ser as respostas dos diplomatas aos questionamentos, explicando em detalhes os trâmites do processo de impeachment.

"A presidente foi acusada de haver violado regras orçamentárias mediante a abertura de créditos suplementares sem prévia autorização legislativa [...] Trata-se de hipótese inconteste de aplicação do rito do impeachment, nos termos da Constituição."

E conclui dizendo que o processo existe "exatamente para permitir o afastamento de suas funções dos agentes públicos que cometam crimes de responsabilidade".

Procurado, o Itamaraty disse que não ia comentar.

Em março, após enviar um telegrama a embaixadas alertando para "o risco de golpe", o diplomata Milton Rondó Filho recebeu uma advertência do Itamaraty. Tratava-se de iniciativa individual de Rondó, sem autorização prévia. 

fonte: Folha SP

sábado, 21 de maio de 2016

Brazil: Towards a New Foreign Policy?

























Post Western World
Oliver Suenkel, 20 may 2016

On Wednesday afternoon, International Relations scholars across Brazil gathered in front of their computer screens as the newly minted Foreign Minister José Serra took to the podium at Itamaraty Palace for the first time. His 19-minute long speech, during which he presented the "guidelines of the New Brazilian Foreign Policy", marked the most significant change in Brazil's international strategy in years. 
Indeed, in comparison to his colleagues in the one-week old Temer cabinet, Serra most clearly sought to show how his policies would differ from those under Lula and Dilma Rousseff. Most importantly, the new Foreign Minister vowed to end what he called the PT's "ideology-driven foreign policy" (referring mostly to Brazil's strategic proximity to Venezuela and other left-leaning governments in the region) and announced Brazil would "no longer restrict its freedom and extent of initiative due to an exclusive and paralyzing adhesion to the multilateral efforts within the scope of the WTO."
Reactions were immediate across the board. Serra would destroy Brazil's hard fought gains achieved under Lula on the international stage and transform Brazil into Washington's lackey, the left-wing commentators crowed. Many PT critics, on the other hand, marvelled at the seemingly radical shift, hoping for closer ties with Western powers and less emphasis on South-South relations. 
Neither of those two groups' views adequately capture the major changes that Brazilian foreign policy under José Serra will most likely undergo. 
A political heavyweight in Itamaraty Palace
Indeed, the first change has little to do with José Serra's personal views and can only be explained by political dynamics in Brasília. Contrary to most of his predecessors in the past decades, Serra is a nationally known political figure who ran for President twice (losing to Lula in 2002 and Dilma Rousseff in 2010). 
He was Minister of Health under Fernando Henrique Cardoso, mayor of the city of São Paulo as well as governor and senator of São Paulo, Brazil's most populous state. This alone will change the weight and visibility of Itamaraty inside the Temer government.
And yet, more important still, Serra plans to run for president again in 2018, and will thus use international politics as a platform to articulate his candidacy. His first week as Foreign Minister provided some insight into how quickly his persona has elevated the importance of foreign policy. 
On Friday afternoon, the Foreign Ministry released a stern note, written by Serra himself, criticizing countries of the Bolivarian Alliance for spreading "misinformation about the domestic political process in Brazil." His move made headlines in the Brazilian media over the weekend, and Serra, perhaps more than any other Minister in the new cabinet, succeeded in representing the break with the former government's policies (Temer's Minister of Finance and Serra's rival in the 2018 presidential race, Henrique Meirelles, said he'd need a few more days to announce his economic plan). 
Serra's inaugural address on Wednesday was the most coveted event in Brasília that day, and his speech was interrupted by applause, two firsts in Itamaraty's recent history. These dynamics will be crucial to understand Brazil's foreign policy under Serra -- particularly considering that the presidential campaign for 2018 has already begun, being more pulverized and unpredictable than any other since 1989. 
While observers who dislike Serra fret that he'll "abuse" foreign policy for political purposes, having a known politician with presidential ambitions as Foreign Minister is not a bad thingper se -- indeed, there is little historical evidence that it does any harm, as the cases of former President Fernando Henrique Cardoso (Foreign Minister in the 1990s) or Hillary Clinton (Foreign Minister under Obama) show. 
Quite to the contrary, Carl Bildt, Joschka Fischer, and Frank-Walter Steinmeier are additional examples that show how political heavyweights can strengthen a country's foreign policy. 
Indeed, in Brazil's case, it is a refreshing change after the remarkable potential of Itamaraty, an island of excellence in the Brazilian government, was woefully wasted under Dilma Rousseff, who never understood the importance of foreign policy for her government. 
A new macroeconomic and geopolitical context
The second change has less to do with the ideological differences between PT and PSDB, but with the radically new macroeconomic and geopolitical context Serra will operate in. 
Some believe that Fernando Henrique Cardoso's pro-Western views led him to seek closer ties to Washington, and Lula, more aligned with the Global South, single-handedly decided to change course. Serra, according to this view, will merely revert back to Brazil's pre-Lula foreign policy, and neglect the BRICS and Africa. 
Such a simplistic view overlooks that the context within which Brazil operated underwent profound changes over the past two decades. 
Asia and Africa mattered far less when Cardoso was President, so mostly focusing on South-South ties at the time would have been unrealistic. When Lula became President, the global shift of power to Asia was underway, and he adapted accordingly (for example, by brilliantly using a positive 'rising power' foreign policy to mute the mensalão corruption scandal in 2005, or by understanding that the 2008 financial crisis provided a window of opportunity for Brazil).
Had Lula been President in the 1990s, before the commodity boom, he would not have been able to articulate and implement such an expansive foreign policy, involving remarkable institutional entrepreneurism (UNASUR, etc.) and Brazil's participation in the BRICS grouping. 
Conversely, had Serra won the presidential election in 2002, he would have also focused a lot on the rise of the Global South, which shaped the global agenda at the time. Indeed, Serra's critics are usually unaware of the fact that, as President, he would have named Celso Amorim as his Foreign Minister. As Minister of Health under Cardoso, Serra took an important step towards strengthening South-South ties when Brazil led the process of breaking patents of retrovirals and began producing generic drugs to address the HIV/AIDS crisis in the Global South. 
The same is true for the region, where considering the new geopolitical dynamics will be crucial to explain Brazil's strategy. Thanks to sky-high oil prices, Lula had to deal with an empowered Hugo Chavez, who had to be understood not as an ally, but as a threat to Brazil's regional leadership ambitions at the time. 
Containing Venezuela openly would have certainly backfired, as Caracas generously financed developing projects in the region, buying diplomatic support from Buenos Aires and Quito to Havana and beyond. Even a PSDB President at the time would have sought to accommodate, rather than attack, Venezuela's unpredictable leader. 
Ten years later, oil prices are back to normal, Venezuela is the world's worst performing economy and faces civil unrest and diplomatic isolation. Rather than symbolizing a complete break, Serra's decision to criticize Maduro is also, to an extent, a continuation of a process of estrangement between Venezuela and Brazil which had already been going on for years. 
Three months ago, Rousseff's Foreign Minister Mauro Vieira became the first leading Brazilian government representative in seventeen years to officially welcome members of Venezuela's opposition in Brasília. 
The same is true with regard to trade: Even high-ranking members of the Rousseff administration had agreed that Brazil's stance on trade needed change, and that Brasília's focus on multilateral negotiations had led to the isolation of the world's seventh largest economy. Looking forward, it remains to be seen whether little more than two years is enough for Serra to make any meaningful progress in the trade realm. 
This does not mean that Serra's promise of a 'New Brazilian Foreign Policy' is empty talk. Brazil's international strategy will change, most clearly vis-à-vis the region, and Serra's political weight and ambition will boost Itamaraty's visibility. 
Yet the new Foreign Minister's rhetoric may lead observers to overestimate the degree of change that is underway. While Folha de São Paulo commented that Serra would leave "no stone unturned", many key elements of Brazil's foreign policy will remain in place -- and rightly so. 
China is Brazil's most important trading partner and Serra understands that being on good terms with Beijing is mandatory in the 21st century. The benefits of the BRICS grouping are recognized, and Temer will participate in the 8th Summit in India in October. Ties to the United States may be strengthened, but several of the disagreements between Brasília and Washington -- for example regarding the United States' military presence in Colombia -- will remain as they are structural in nature. 
In the same way, ending unconditional support for Maduro was not decided on a whim, but can be understood as a very pragmatic decision, as Venezuela's politics and economy are imploding -- put differently, being Maduro's partner is no longer an asset, but increasingly toxic. 
Alas, dealing with the fallout of the Venezuelan crisis -- for which Brazil is partly responsible -- will be one of Serra's most difficult challenges early on. He has no choice but to hit the ground running.

sexta-feira, 20 de maio de 2016

José Serra no MRE: como ficam as relações com a América Latina ?




















Com Temer e Serra, como ficam as relações do Brasil com a América Latina?

UOL
20 maio 2016

O governo do presidente interino Michel Temer (PMDB) reagiu de forma dura a manifestações de governos de países como Venezuela, Equador, Cuba e Nicarágua com críticas ao processo de impeachment da presidente afastada Dilma Rousseff (PT). O mesmo aconteceu em relação à Unasul (União de Nações Sul-americanas). Os atritos podem abalar as relações do Brasil com os países da América Latina?
Os governos de países que questionaram o afastamento de Dilma são mais próximos, ideologicamente, ao PT. "A nossa política externa será regida pelos valores do Estado e da nação, não de um governo e jamais de um partido", afirmou o ministro de Relações Exteriores, José Serra, em seu discurso de posse na quarta-feira (18).
Antes, o ministério havia emitido notas para rechaçar aquilo que considerou "falsidades" propagadas por Venezuela, Cuba, Bolívia, Equador e Nicarágua. Em relação ao secretário-geral da Unasul, Ernesto Samper, o governo interino afirmou que seus "juízos e interpretações em geral são incompatíveis com as funções que exerce e com o mandato que recebeu".

Comércio preservado

Especialistas em relações internacionais entendem que a mudança de governo no Brasil e o tom adotado inicialmente pelo ministro das Relações Exteriores, José Serra, podem dificultar a formulação de consensos na região, mas não devem prejudicar as negociações bilaterais e o comércio com cada país latino-americano.
"De todas as políticas de Estado, a política externa é a que mais demora para ter algum tipo de alteração", afirma Reginaldo Nasser, professor de Relações Internacionais da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo).
Muitas vezes, diz o pesquisador, divergências ideológicas não abalam as relações comerciais entre países. Ele cita como exemplo o período em que Venezuela e Estados Unidos mantiveram seus negócios mesmo com a forte polarização entre os então presidentes Hugo Chávez e George W. Bush. "Em política externa, há muito mais barulhos do que fatos."
Nasser também afirmou que o recado de Serra a governos latino-americanos de esquerda representa mais uma sinalização para reforçar seu próprio campo ideológico no Brasil. O ministro teria a pretensão de viabilizar para 2018 sua terceira candidatura a presidente – foi derrotado nas eleições de 2002 e 2010. "O recado é no momento um instrumento muito mais para dentro do que para fora do país."

Exportações para América Latina são importantes

Alcides Cunha, professor do Instituto de Relações Internacionais da UnB (Universidade de Brasília), também acredita que o comércio com países latinos críticos ao governo interino será preservado.
De acordo com dados do Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio, as exportações brasileiras para o conjunto dos países da América Latina equivaleram em 2015 às vendas para a Europa, superaram as vendas para os Estados Unidos e só ficaram abaixo do total exportado para a Ásia.
O governo interino tem a intenção de aumentar as exportações de produtos manufaturados para os países mais ricos. Mas a ampliação da capacidade brasileira de exportar manufaturados esbarra, segundo Alcides Cunha, em dois limites: a reduzida competitividade da indústria nacional e a dificuldade de se estabelecer acordos comerciais que viabilizem a entrada de produtos nesses países.
"A competitividade da nossa indústria não se resolve em pouco tempo", afirma o docente da UnB. Em sua opinião, essas dificuldades reforçam a necessidade de o Brasil manter os laços comerciais com os latino-americanos. "A venda de produtos brasileiros industrializados só tem dinamismo no mercado regional [atualmente]."

Atenção ao Mercosul 

Na opinião de Alcides Cunha, a nova posição de Serra em relação ao Mercosul já reflete o pragmatismo influenciado por interesses comerciais. Apesar de ser um crítico do bloco, o tucano defendeu, durante o discurso de posse, sua renovação e seu fortalecimento.
Também afirmou que "um dos principais focos de nossa ação diplomática em curto prazo será a parceria com a Argentina". "Por mais que Serra não goste, a indústria brasileira depende do Mercosul", comenta o pesquisador.
"Nas relações bilaterais com países como Bolívia e Venezuela, as divergências políticas tendem a ser absorvidas. Os negócios deverão estar na agenda. A clivagem política vai ser mitigada pelos interesses comerciais, pela busca de cooperação com os países vizinhos, pela dificuldade estrutural de mudar a composição da pauta exportadora brasileira e de conseguir maior presença comercial nos países mais dinâmicos", diz Alcides Cunha.

Crise na Venezuela

Para o professor da UnB, a cisão ideológica entre os governos da região deve paralisar a Unasul, e esse impasse não deve ser resolvido rapidamente porque depende, principalmente, do desfecho das crises internas da Venezuela e do próprio Brasil.
O diretor para as Américas da organização Human Rights Watch, José Miguel Vivanco, afirmou nesta quinta-feira (19) que a situação na Venezuela é muito grave e indicou a necessidade de a comunidade regional atuar para "evitar que se transforme em violência".
O governo Nicolás Maduro tenta impedir a realização de um referendo que poderia revogar o mandato do presidente venezuelano. A Human Rights Watch pediu nesta semana que a OEA (Organização de Estados Americanos) invoque a Carta Democrática Interamericana para exigir que a Venezuela proteja os direitos fundamentais dos cidadãos e restabeleça a independência dos organismos judiciais.
fonte: UOL

quinta-feira, 19 de maio de 2016

Discurso de posse de José Serra no MRE

























Brasília
18 maio 2016

"Queria saudar inicialmente o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal;
O presidente do STJ, ministro Francisco Falcão;
Ministro Herman Benjamin, ministro Rogério Schietti e ministro Paulo Moura;
Queria cumprimentar, e através dele todos os deputados aqui presentes, o presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara, Pedro Vilela;
E o presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado, meu colega do Senado, Aloysio Nunes, através de quem cumprimento todos os nossos queridos amigos senadores;
Queria saudar excelentíssimo ex-presidente da República, José Sarney, que, considero, teve um papel fundamental no processo de redemocratização do nosso país e merece ser reconhecido em todos os tempos por este papel.
Quero cumprimentar o senhor Núncio Apostólico, dom Giovanni d´Aniello, em nome de quem cumprimento os demais embaixadores estrangeiros acreditados junto ao governo brasileiro;
E dar aqui o meu abraço ao embaixador Mauro Vieira, ex-ministro de estado das Relações Exteriores, a quem agradeço a prestatividade, diria assim, e toda a colaboração nesse processo de transição do comando do Ministério. Quero dizer a ele que considero um homem que teve uma trajetória pública exemplar.
Quero agradecer também, muito enfaticamente, ao presidente Michel Temer pela confiança ao convidar-me para assumir este ministério, bem como pela paciência de revisar e pela aprovação deste Delineamento da Nova Política Externa Brasileira, que apresentarei hoje. O presidente leu ao meu lado, linha por linha, fazendo seus comentários, que naturalmente levei em conta. Quero dizer que trinta e três anos de convivência com Michel Temer, seja no mesmo lado ou em lados diferentes da vida política, foram sempre acompanhados de uma relação constante de amizade, respeito mútuo e permanente diálogo.
E quero por último, aqui agradecer a presença dos meus colegas de Ministério, são muitos, eu os saúdo em nome do ministro Romero Jucá, que, quis o destino, vai ter um papel junto comigo fundamental para a recuperação das finanças do Itamaraty.
Creio que os outros ministros entenderão por que escolhi o ministro Jucá para representá-los nesta saudação.
Deixe me dizer também de minha alegria em passar a integrar uma instituição de grande tradição e de marcada contribuição histórica ao nosso país. Deixe me dizer também da satisfação em conviver com um corpo de funcionários de reconhecida competência e espírito público. 
Eu espero aqui transmitir algumas ideias essenciais a respeito da nova política externa brasileira. Tenho e terei, como sempre em minha vida pública, os olhos voltados para o futuro e não para os desacertos do passado.
Primeira diretriz:
1. A diplomacia voltará a refletir de modo transparente e intransigente os legítimos valores da sociedade brasileira e os interesses de sua economia, a serviço do Brasil como um todo e não mais das conveniências e preferências ideológicas de um partido político e de seus aliados no exterior. A nossa política externa será regida pelos valores do Estado e da nação, não do governo e jamais de um partido. 
Essa nova política não romperá com as boas tradições do Itamaraty e da diplomacia brasileira, mas, ao contrário, as colocará em uso muito melhor. Medidas que, em outros momentos, possam ter servido ao interesse nacional, quero dizer, podem não ser mais compatíveis com as novas realidades do país e com as profundas transformações em curso no cenário internacional.
Segunda diretriz:
2. Estaremos atentos à defesa da democracia, das liberdades e dos direitos humanos em qualquer país, em qualquer regime político, em consonância com as obrigações assumidas em tratados internacionais e também em respeito ao princípio de não ingerência.
Terceira diretriz: 
3. O Brasil assumirá a especial responsabilidade que lhe cabe em matéria ambiental,  como detentor na Amazônia da maior floresta tropical do mundo, de uma das principais reservas de água doce e de biodiversidade do planeta, assim como de matriz energética limpa e renovável, a fim de desempenhar papel proativo e pioneiro nas negociações sobre mudança do clima e desenvolvimento sustentável. 
Lembro que, se fizermos bem a lição de casa, poderemos receber recursos caudalosos de entidades internacionais interessadas em nos ajudar a preservar as florestas e as reservas de água e biodiversidade do planeta, uma vez que o Brasil faz a diferença nessa matéria.
Quarta diretriz:  
4. Na ONU e em todos os foros globais e regionais a que pertence, o governo brasileiro desenvolverá ação construtiva em favor de soluções pacíficas e negociadas para os conflitos internacionais e de uma adequação de suas estruturas às novas realidades e desafios internacionais; ao mesmo tempo em que se empenhará para a superação dos fatores desencadeadores das frequentes crises financeiras e da recente tendência à desaceleração do comércio mundial. O comércio mundial está se contraindo a galope, eu diria.
Quinta diretriz:
5. O Brasil não mais restringirá sua liberdade e latitude de iniciativa por uma adesão exclusiva e paralisadora aos esforços multilaterais no âmbito da Organização Mundial do Comércio, como aconteceu desde a década passada, em detrimento dos interesses do país. 
Não há dúvida de que as negociações multilaterais da OMC são as únicas que poderiam efetivamente corrigir as distorções sistêmicas relevantes, como as que afetam o comércio de produtos agrícolas. Mas essas negociações, infelizmente, não vêm prosperando com a celeridade e a relevância necessárias, e o Brasil, agarrado com exclusividade a elas, manteve-se à margem da multiplicação de acordos bilaterais de livre comércio. 
O multilateralismo que não aconteceu prejudicou o bilateralismo que aconteceu em todo o mundo. Quase todo mundo investiu nessa multiplicação, menos nós. Precisamos e vamos vencer esse atraso e recuperar oportunidades perdidas.
Sexta diretriz:
6. Por isso mesmo, daremos início, junto com o Ministério da Indústria, Comércio e Serviços, com a cobertura da CAMEX e em intensa consulta com diferentes setores produtivos, a um acelerado processo de negociações comerciais, para abrir mercados para as nossas exportações e criar empregos para os nossos trabalhadores, utilizando pragmaticamente a vantagem do acesso ao nosso grande mercado interno como instrumento de obtenção de concessões negociadas na base da reciprocidade equilibrada. 
Nada seria mais equivocado, errôneo, nesta fase do desenvolvimento brasileiro, do que fazer concessões sem reciprocidade. Não tem sentido.
Sétima diretriz:
7. Um dos principais focos de nossa ação diplomática em curto prazo será a parceria com a Argentina, com a qual passamos a compartilhar referências semelhantes para a reorganização da política e da economia. 
Junto com os demais parceiros, precisamos renovar o Mercosul, para corrigir o que precisa ser corrigido, com o objetivo de fortalecê-lo, antes de mais nada quanto ao próprio livre-comércio entre seus países membros, que ainda deixa a desejar, de promover uma prosperidade compartilhada e continuar a construir pontes, em vez de aprofundar diferenças, em relação à Aliança para o Pacifico, que envolve três países sul-americanos, Chile, Peru e Colômbia, mais o México. 
Como disse Enrique Iglesias, muito bem observado, não podemos assistir impassíveis à renovação de uma espécie de Tratado de Tordesilhas, que aprofundaria a separação entre o leste e o oeste do continente sul-americano.  Em relação ao México, será prioritário aproveitar plenamente o enorme potencial de complementaridade existente entre nossas economias e hoje das nossas visões internacionais.
Oitava diretriz:
8. Vamos ampliar o intercâmbio com parceiros tradicionais, como a Europa, os Estados Unidos e o Japão. A troca de ofertas entre o Mercosul e a União Europeia será o ponto de partida para avançar na conclusão de um acordo comercial que promova maior expansão de comercio e de investimentos recíprocos, sem prejuízo aos legítimos interesses de diversos setores produtivos brasileiros. 
Como disse o ministro Mauro, houve a troca de ofertas, nós vamos agora examinar quais são as ofertas da União Europeia. Com os Estados Unidos, nós confiamos em soluções práticas de curto prazo para a remoção de barreiras não-tarifárias, que são, no mundo de hoje, as essenciais. No mundo de hoje não se protege, do ponto de vista comercial, com tarifas. Se protege com barreiras não-tarifárias. 
Quero dizer que o Brasil nesse sentido é o mais aberto do mundo. Nós não temos nenhuma barreira não-tarifária, ao contrário de todos os outros que se apresentam como campeões do livre comércio. Com os Estados Unidos, confiamos em soluções práticas de curto prazo, eu repito, para a remoção de barreiras não-tarifárias,  e de regulação que entorpecem o intercâmbio. Daremos igualmente ênfase às imensas possibilidades de cooperação em energia, meio ambiente, ciência, tecnologia e educação.
Nona diretriz:
9. Será prioritária a relação com parceiros novos na Ásia, em particular a China, este grande fenômeno econômico do século XXI, e a Índia. 
Estaremos empenhados igualmente em atualizar o intercâmbio com a África, o grande vizinho do outro lado do Atlântico. Não pode esta relação restringir-se a laços fraternos do passado e às correspondências culturais, mas, sobretudo, forjar parcerias concretas no presente e para o futuro. Ao contrário do que se procurou difundir entre nós, a África moderna não pede compaixão, mas espera um efetivo intercâmbio econômico, tecnológico e de investimentos. 
Nesse sentido, a solidariedade estreita e pragmática para com os países do Sul do planeta terra continuará a ser uma diretriz essencial da diplomacia brasileira. Essa é a estratégia Sul-Sul correta, não a que chegou a ser praticada com finalidades publicitárias, escassos benefícios econômicos e grandes investimentos diplomáticos. 
É importante ter a noção clara de que os diferentes eixos de relacionamento do Brasil com o mundo não são contraditórios nem excludentes, sobretudo dado o tamanho da nossa nação. Um país do tamanho do Brasil não escolhe ou repele parcerias, busca-as todas com intensidade, inspirado no seu interesse nacional. 
Vamos também aproveitar as oportunidades oferecidas pelos foros inter-regionais com outros países em desenvolvimento, como por exemplo os BRICS, para acelerar intercâmbios comerciais, investimentos e compartilhamento de experiências. E, com sentido de pragmatismo, daremos atenção aos mecanismos de articulação com a África e com os países árabes.
Décima diretriz:
10. Nas políticas de comércio exterior, o governo terá sempre presente a advertência que vem da boa análise econômica, apoiada em ampla e sólida consulta com os setores produtivos. 
É ilusório supor que acordos de livre comércio signifiquem necessariamente a ampliação automática e sustentada das exportações. Só há um fator que garante esse aumento de forma duradoura: o aumento constante da produtividade e da competitividade. Se alguém acha que basta fazer um acordo e abrir, que isso é condição necessária suficiente, está enganado. É preciso investir no aumento constante da competitividade e da produtividade. 
Daí a ênfase que será dada à redução do custo Brasil, mediante a eliminação das distorções tributárias que encarecem as vendas ao exterior e a ampliação e modernização da infraestrutura por meio de parcerias com o setor privado, nacional e internacional. 
O custo Brasil hoje é da ordem de 25%, ou seja, uma mercadoria brasileira idêntica a uma mercadoria típica média dos países que são nossos parceiros comerciais, custa, por conta da tributação, dos custos financeiros, dos custos de infraestrutura, dos custos tributários, 25% a mais. Imagine-se o desafio que nós temos por diante. 
E apenas assumi o ministério, eu me dei conta, conversando com nosso embaixador na China, o Roberto Jaguaribe, do esforço de nossas embaixadas para atrair investimentos nestes setores básicos da economia. O Roberto estava trabalhando inclusive para seduzir os capitais chineses a virem ao Brasil, investir em parceria com o Estado brasileiro nas obras de infraestrutura. Esse esforço será multiplicado, tenho certeza, com sucesso.
Aqui encerro as diretrizes, mas se eu tivesse que  acrescentar uma a mais, me alongar, que valeria a pena se alongar, eu citaria uma que temos que cumprir, colaborando com os ministérios da Justiça, da Defesa e da Fazenda, no que se refere à Receita Federal: a proteção das fronteiras, hoje o lugar geométrico do desenvolvimento do crime organizado no Brasil, vamos ter isso claro, que se alimenta do contrabando de armas, contrabando de mercadorias, que é monumental, e do tráfico de drogas. 
Em especial, nos empenharemos em mobilizar a cooperação dos países vizinhos para uma ação conjunta contra essas práticas criminosas que tanto dano trazem ao nosso povo e à nossa economia.
Por último, não menos importante, quero reafirmar meu compromisso com as comunidades brasileiras no exterior e o bom funcionamento de nosso serviço consular. Continuaremos a dar atenção prioritária à garantia dos direitos dos cidadãos brasileiros, onde quer que eles estejam.
Dirijo-me agora ao corpo de funcionários do ministério. Nós vamos recuperar a capacidade de ação do Itamaraty, acreditem. Num período de grandes transformações e, por que não dizer, incertezas no cenário internacional e de promissoras mudanças internas, a nossa diplomacia, não tenho dúvida, terá de, gradualmente, atualizar-se e inovar, e até mesmo ousar, promovendo uma grande reforma modernizadora nos objetivos, métodos e técnicas de trabalho. 
A diplomacia do século XXI não pode repousar apenas na exuberância da retórica e no tom auto-laudatório dos comunicados conjuntos. Precisa ter objetivos claros e ser a um só tempo discurso político e resultado concreto.
Os diplomatas brasileiros despertam o orgulho do país e o respeito dos parceiros do Brasil no exterior. Quero valorizar a carreira diplomática, assim como as demais carreiras do serviço exterior. Respeitar o critério do mérito. Não discriminar em favor dos amigos do rei ou de correligionários de um partido político. 
Quero progressivamente retirar o Itamaraty da penúria de recursos em que foi deixado pela irresponsabilidade fiscal que dominou a economia brasileira nesta década. Quero reforçar a casa, e não enfraquecê-la. Vamos restaurar o orgulho das novas gerações em servir ao Itamaraty e, sobretudo, ao Brasil. A Casa será reforçada, e não enfraquecida. E no governo do presidente Temer, o Itamaraty volta ao núcleo central do governo.
Meu programa de ação corresponderá à minha tradição na vida pública: trabalhar muito, apresentar e receber ideias, tomar iniciativas, delegar responsabilidades, cobrar resultados e promover negociações efetivas, bem como ter presença marcante, longe de cumprir um calendário de visitas inócuas, para “cumprir tabela”.
Estes são compromissos que apresento hoje. Este é o convite que faço a todos os servidores desta Casa, a fim de que façamos um esforço comum para valorizar o Itamaraty e pelo êxito de um governo que enfrentará, como todos sabemos, desafios imensos, mas que criará, se Deus quiser, as condições para a reconstrução do sistema político, o fortalecimento da representatividade da nossa democracia e a volta do crescimento da produção e do emprego.
Muito obrigado, mãos à obra, vamos em frente."
fonte: Itamaraty

José Serra no MRE: Como fica o Itamaraty ?






































Como fica o Itamaraty com José Serra ministro das Relações Exteriores ?
José Serra terá um Itamaraty turbinado pela Apex, mas com pouco tempo e recursos para grandes mudanças

Época
13 maio 2016


Quem espera uma guinada liberal na política externa brasileira, ou mudanças profundas nos temas mais espinhosos no Ministério das Relações Exteriores, pode ter uma decepção com a chegada de José Serra ao Itamaraty. Certamente a saída de Dilma Rousseff e dos petistas da Presidência da República vai significar o sepultamento da diplomacia condescendente com os governos de esquerda da região. 
Também significará uma tentativa de dar mais enfoque ao comércio exterior do que na gestão de Dilma. Mas o tempo curto, a falta de apoio popular ao governo Michel Temer e a falta de recursos em função da crise econômica serão entraves grandes para o novo ministro.
"Haverá mudanças profundas onde fazer a mudança for fácil", afirma Matias Spektor, coordenador do Centro de Relações Internacionais da Fundação Getulio Vargas. "Em relação à Venezuela, a mudança de tom será dramática, será o fim rápido de qualquer tendência pró-bolivariana por parte do governo brasileiro. Isso é fácil de mudar porque o regime venezuelano está implodindo sozinho. Mas em áreas onde há muitos interesses brasileiros em jogo, como o Mercosul, será difícil ver uma guinada radical. Porque apesar de o Serra ser crítico do Mercosul, o Temer não chega ao governo com um mandato popular para fazer grandes guinadas. Temer vai evitar, na medida do possível, comprar grandes brigas".
Além disso, há uma importante questão no caminho de Serra: o tempo. 
"Em relação ao comércio, existe uma predisposição maior, mas há muita dúvida em relação a quanto se pode conseguir em um período muito curto. A partir de abril de 2018, não vai ter mais um governo que consiga fazer grandes coisas, porque todo mundo estará olhando para a eleição", afirma Oliver Stunkel, professor de relações internacionais da Fundação Getúlio Vargas (FGV). "Acordos comerciais não são coisas rápidas, elas levam tempo. Estamos há mais de uma década negociando o acordo com a União Europeia. O que nós vamos ver nos próximos dias são símbolos, são atos simbólicos para demonstrar que o Brasil procura melhorar sua avaliação ruim, no ranking do Banco Mundial. É pouco provável que vamos ver uma guinada liberal radical na política externa, porque isso são coisas que requerem um tempo. Tanto que uma liberalização gera sempre resistência interna".
Mesmo com a o contingenciamento de recursos Serra vai assumir um Ministério das Relações Exteriores turbinado com a Apex, a Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos. A Apex tem orçamento de R$ 590 milhões e grande parte desses recursos não são contingenciáveis, já que vêm do sistema S. O Sistema S, que inclui Senai, Sesi, Sebrae, é financiado com recolhimentos compulsórios das empresas. 
Os recursos trarão alívio ao Itamaraty, que passou por sucessivos cortes e hoje tem orçamento de R$ 2,98 bilhões. Serra também pode coordenar a Câmara de Comércio Exterior (Camex). Temer quer ter a Camex sob sua saia. Hoje em dia ela é presidida pelo ministro do Desenvolvimento e tem no conselho outros seis ministros. Na reformulação, a Camex passaria a ter o presidente da República como presidente e teria uma secretaria executiva. Serra também é cotado para ser nomeado secretario executivo da Camex.
O objetivo é fazer a Camex se transformar no principal órgão formulador de política comercial do país. Serra pretende incrementar as rodadas de negócios, feiras internacionais e uma atuação mais ousada junto aos potenciais compradores de produtos e serviços brasileiros. 
"Não é apenas uma questão de nomenclatura, isso vai mudar muita coisa", afirma Rubens Barbosa, que foi embaixador do Brasil nos Estados Unidos entre 1999 e 2004. "Vai acabar com a influencia ideológica, a política partidária que dominou o Itamaraty nesses 13 anos, e vai ajudar na abertura de negociações com outros parceiros além dos bolivarianos regionais, vai retirar o foco do isolamento e fazer o Brasil ter voz mais forte no comércio exterior".
Para alguns analistas, colocar Serra no Ministério das Relações Exteriores foi uma manobra de mestre de Michel Temer, similar à feita por Barack Obama em 2009, quando colocou Hillary Clinton como Secretaria de Estado dos EUA (cargo que ela ocupou até 2013). A manobra de Obama visava agradar Hillary com um cargo imponente, para não tê-la como inimiga política, ao mesmo tempo em que a mantinha distante do cotidiano do governo, sem interferência nas políticas de Obama para os EUA. 
"Como Serra ainda tem pretensões políticas evidentes, e vai querer influenciar o resultado da campanha, fará o melhor trabalho possível a frente do Itamaraty", afirma Matias Spektor. "O chanceler passa muito tempo fora do país. Como o Serra é um ministro que ocupa muito espaço, aparece muito, era melhor tê-lo dentro da tenda cuspindo pra fora, do que fora da tenda cuspindo pra dentro".
Entre diplomatas de carreira, há um clima de entusiasmo com a indicação de um nome representativo para a pasta. Há avaliação de que haverá mais trânsito político junto ao Planalto e que o Itamaraty deixará de ser deixado de escanteio - uma fonte disse que o Itamaraty “estava entregue às baratas” e que agora é possível um certo “resgate de autoestima” entre os diplomatas e da tradição do debate de políticas a serem encampadas dentro da pasta. 
Uma mudança significativa depois dos anos Dilma Rousseff, em que a política externa foi esvaziada e o Itamaraty acabou destituído de prerrogativas e recursos.

quarta-feira, 18 de maio de 2016

Manifestações sobre a situação interna do Brasil

























Diplomacia Pública

Com a abertura do processo de impeachment e o afastamento da presidente Dilma do poder, alguns países da América do Sul manifestaram posição contrária aos acontecimentos e não reconhecem como legítimo o governo do presidente interino Michel Temer.    

O Secretário-Geral da UNASUL, senhor Ernesto Samper, também manifestou-se contrariamente aos acontecimentos, gerando desconforto no meio diplomático brasileiro e reações do novo chanceler José Serra. 

O Itamaraty publicou nesta última sexta-feira, dia 13 de maio, notas de repúdio às declarações de Venezuela, Cuba, Bolívia, Equador, Nicarágua, El Salvador e do Secretário da Unasul

NOTA 176
Manifestações sobre a situação interna no Brasil

O Ministério das Relações Exteriores rejeita enfaticamente as manifestações dos governos da Venezuela, Cuba, Bolívia, Equador e Nicarágua, assim como da Aliança Bolivariana para os Povos de Nossa América/Tratado de Comércio dos Povos (ALBA/TCP), que se permitem opinar e propagar falsidades sobre o processo político interno no Brasil. Esse processo se desenvolve em quadro de absoluto respeito às instituições democráticas e à Constituição Federal.
Como qualquer observador isento pode constatar, o processo de impedimento é previsão constitucional; o rito estabelecido na Constituição e na Lei foi seguido rigorosamente, com aval e determinação do STF; e o Vice-Presidente assumiu a presidência por determinação da Constituição Federal, nos termos por ela fixados.
O Ministério das Relações Exteriores repudia declarações do Secretário-Geral da UNASUL, Ernesto Samper, sobre a conjuntura política no Brasil, que qualificam de maneira equivocada o funcionamento das instituições democráticas do Estado brasileiro.
Os argumentos apresentados, além de errôneos, deixam transparecer juízos de valor infundados e preconceitos contra o Estado brasileiro e seus poderes constituídos e fazem interpretações falsas sobre a Constituição e as leis brasileiras. Além disso, transmitem a interpretação absurda de que as liberdades democráticas, o sistema representativo, os direitos humanos e sociais e as conquistas da sociedade brasileira se encontrariam em perigo. A realidade é oposta.
Tais juízos e interpretações do Secretário-Geral são incompatíveis com as funções que exerce e com o mandato que recebeu do conjunto de países sul-americanos nos termos do Tratado Constitutivo e do Regulamento Geral da UNASUL.

O Ministério das Relações Exteriores tomou conhecimento das manifestações do governo de El Salvador sobre o processo político brasileiro e de sua decisão de suspender contatos oficiais com o Brasil, que revelam amplo e profundo desconhecimento sobre a Constituição e a legislação brasileiras, sobre o rito aplicável em processos de impedimento e sobre o pleno funcionamento das normas e instituições democráticas no país.
Causam especial estranheza tantos equívocos, uma vez que El Salvador mantém intensas relações econômicas com o Brasil e é o maior beneficiário de cooperação técnica brasileira em toda a América Central.
Por isso tudo o governo brasileiro espera que o governo de El Salvador reconsidere sua posição, com base em avaliação objetiva e factual da realidade, e em respeito às instituições brasileiras e aos princípios que têm regido as relações entre os dois países.

fonte: Itamaraty

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