Folha SP
Mathias Spektor
6 jul 2017
Não importa se você gosta de editoriais antichavistas ou se prefere as notas pró-Maduro do PT. Seja qual for a sua preferência, você achava que Michel Temer trabalharia para se afastar da Venezuela e pressionar o regime em Caracas.
Passado um ano de governo, é hora de pensar de novo.
Temer jogou seu peso para suspender a Venezuela do Mercosul, mas evitou o desgaste de fazê-lo em nome da democracia, apoiando-se, em vez disso, numa pirueta jurídica para punir o país pela não incorporação de normas mercosulinas.
O presidente também aderiu àqueles países que tentaram condenar a ruptura da ordem democrática na Venezuela na Organização dos Estados Americanos (OEA), mas não mobilizou sua rede de embaixadas no Caribe para fazer o corpo a corpo que seria necessário a fim de selar uma vitória.
Temer ainda chamou o embaixador brasileiro em Caracas para "consultas", aparente sinal de distanciamento em relação ao chavismo. Semana passada, porém, mandou-o de volta ao posto, mesmo se tratando de um representante nomeado por Dilma.
Os chanceleres deste governo foram à Rádio Jovem Pan para repetir a tese da "ruptura da ordem democrática", mas nunca contemplaram a possibilidade de acionar o mecanismo que a própria diplomacia brasileira inventou para situações como essa: a declaração presidencial de Potrero de Los Funes, assinada em 1996 e ratificada dois anos depois pelo Protocolo de Ushuaia. Ela permite a Brasília suspender os acordos bilaterais já firmados com Caracas.
Não à toa, embaixadas estrangeiras em Brasília se perguntam quão séria é a retórica antichavista do governo. Indagam se o comportamento brasileiro é produto de falta de interesse ou falta de força, dada a fragilidade política do presidente.
De fato, a prioridade absoluta de Temer é sobreviver junto à base aliada, não lançar grandes empreitadas no exterior. Sua diplomacia precisa ser de baixo custo e risco zero.
No caso da Venezuela, porém, isso é um problema.
Por um lado, milhares de famílias venezuelanas chegam a Roraima à procura de ajuda. Por outro, a Venezuela tende a virar um narcoestado, e o contágio por meio de uma fronteira que não controlamos seria inevitável. É nossa pior crise de segurança internacional em décadas.
Não há mais nada que o Planalto possa fazer em Caracas. A janela de oportunidade que antes existia já passou. A única prioridade agora deveria ser a de sensibilizar para valer os três países que ainda sustentam o chavismo e seus desmandos: Cuba, China e Rússia.
A julgar pelo andar da carruagem, entretanto, o governo brasileiro não o fará.
fonte: Folha SP
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